sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

FORUM SOCIAL MUNDIAL_ 2012

Fórum Social Temático 2012
Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental


O Fórum Social Temático (FST) se inscreve no processo do Fórum Social Mundial e será uma etapa preparatória a Cúpula dos Povos na Rio+20. O evento acontecerá do dia 24 a 29 de janeiro de 2012 e será sediado por Porto Alegre e cidades da região Metropolitana – Gravataí, Canoas, São Leopoldo, e Novo Hamburgo. Como um espaço aberto e plural, a programação do Fórum será fundamentalmente constituída por atividades propostas e geridas por movimentos, coletivos e organizações da sociedade civil, relacionadas ao tema “Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental”. Além disso, o Fórum acolherá também o encontro de redes internacionais, articuladas em torno de Grupos Temáticos de reflexão sobre assuntos pertinentes ao Fórum. O diálogo no âmbito dos grupos já está em andamento, na Plataforma de Diálogos do Fórum Social Temático .

Por que “Crise capitalista, Justiça Social e Ambiental?
(baseado nos documentos Convocatória ; Metodologia)
Um nível inusitado de atividade de movimentos de massas atinge países conhecidos por sua estabilidade social. Protestos e mobilizações indígenas produzem uma grande efervescência na usualmente tempestuosa região andina. Estudantes em diversos países organizam atos com uma capacidade de mobilização há tempos não vista. Em 15 de outubro tivemos manifestações em quase mil cidades de 82 países.

A indignação com as desigualdades e injustiças políticas e sociais aparece como uma marca comum à maioria destes movimentos que questionam o “sistema” e o “poder”, se confronta com sua destrutividade e rompem com a passividade das décadas neoliberais. Estes movimentos nascem das necessidades e aspirações do presente, dos efeitos das políticas recessivas que se alastram entre países ricos e estagnados pela crise, de manifestações contra práticas opressivas, de povos, comunidades, setores da sociedade que não se sentem representados por seus governantes e almejam políticas mais justas e solidárias, que respeitem todas as formas de vida.

Três anos após a pior crise econômica mundial desde a de 1929, três anos depois da enorme alta nos preços das commodities e dos alimentos pela especulação pelos gigantes das finanças, quatro anos depois do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) ter alertado para a urgência na transição para uma economia de baixo carbono, todos os problemas se arrastam sem perspectivas de solução, com os poderes estabelecidos apenas preocupados em manter os negócios como sempre. Nenhuma lição foi aprendida, nenhuma mudança estrutural foi feita, agravando os impasses que se acumulam em uma lógica suicida.

Na aparente ausência de outro paradigma de civilização, que a confronte, a inércia impera, e a máquina move-se com a mesma lógica de sempre. Na medida em que centenas de milhões de pessoas adentram à sociedade de consumo de massa e perseguem para si o modo de vida que o capitalismo estadounidense exportou como ideal de felicidade, elas demandam uma quantidade crescente de bens ostentatórios, criados dentro da lógica da obsolescência planejada, uso privado, desperdício e descartabilidade. E consomem cada vez mais recursos: energia, matérias primas, alimentos e serviços ambientais. Este crescimento prepara novas e futuras crises de combustíveis, matérias primas e alimentos; acelera as emissões de gases do efeito estufa e o aquecimento global. Frente a elas, o capital apenas pode acenar com ilusórias promessas de que inovações tecnológicas resolverão todos os problemas. E para garantir que nenhuma ameaça ao sistema possa florescer, a democracia é corrompida pelo poder do dinheiro ou, quando necessário, suprimida.

Porto Alegre e Região metropolitana serão, em 2012 o ponto de encontro d@s indignad@s, das expressões dos povos originários e dos movimentos anti-sistêmicos de todos os quadrantes, capaz de afirmar uma saída para a crise, tirando daí as diretrizes e campanhas globais. Afirmar e transmitir um paradigma alternativo de sociedade, construir um vocabulário comum capaz de articular as demandas difusas de grande parcela das populações são imperativos para que sejamos bem sucedidos. Compreendendo a necessidade de ampliar a pauta oficial, determinada pela ONU, para a Rio+20, o Comitê Organizador espera que a sociedade civil organizada aproveite o advento deste Fórum para construir uma reflexão estratégica e programática, capaz também de ser apresentada na Cúpula dos Povos na Rio+20, em junho de 2012, atraindo multidões para o Rio de Janeiro.

Qual a conexão deste Fórum com o processo do Fórum Social Mundial e das demais mobilizações em vistas à Rio+20?O processo Fórum Social Mundial debateu em Belém, em 2009, e novamente em Dakar, em 2011, os grandes desafios de uma civilização global em crise (tanto no sentido de crise como de oportunidades) com o qual estamos confrontados. Discutiu também, de forma mais aprofundada, elementos da nova agenda política que os atores do processo FSM foram ressaltando ao longo do último período: a defesa dos bens comuns e do livre acesso ao conhecimento e à cultura, a centralidade da sustentabilidade social e ambiental em qualquer projeto alternativo, a economia do bem estar e da gratuidade, a busca do bem viver como propósito da vida, a organização do poder político em moldes plurinacionais e baseados na democracia participativa, a relação entre direitos e responsabilidades coletivas, o reordenamento geopolítico mundial e os problemas de governança que ele carrega, dentre outros elementos que formam uma agenda abrangente, mas não exaustiva, que foi acompanhada de inúmeros outros debates e diálogos com as propostas que com ela se cruzam.

Agora – frente a oportunidade representada pela Cúpula dos Povos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental– consideramos que o processo FSM deve oferecer sua contribuição para impulsionar sua preparação e auxiliar a consolidação de sua agenda, organizando um Fórum Social Temático, em Porto Alegre e Região Metropolitana, entre 24 e 29 de janeiro de 2012. Um Fórum que discuta a crise e as medidas emergenciais que tem que ser tomadas para assegurar a sobrevivência e o bem-estar de centenas de milhões de pessoas. Um Fórum que explore os caminhos para a afirmação de paradigmas alternativos à civilização industrial, produtivista e consumista e da agenda da transformação social que lhe corresponde. Um Fórum que aprofunde os laços entre os atores e atrizes comprometidos com esta pauta, mobilize-os para a ação, estimule sua convergência e auxilie sua participação efetiva na Cúpula dos Povos.

Consideramos esta iniciativa – na seqüência dos protestos contra o G20 em novembro, em Paris, e das atividades programadas pela sociedade civil por ocasião da COP 17, em Durban, na África do Sul, em fins de 2011 – decisiva para acumular forças e reforçar a preparação da Cúpula dos Povos da Rio +20.

Então eu já posso participar? O que devo fazer?
Sim!
Além da possibilidade de trabalhar na organização do Fórum, participando das plenárias e de coletivos de trabalho – para saber a agenda de reuniões, entre em contato com fstematico2012@gmail.com – e de se voluntariar a trabalhar durante o evento do Fórum, como indivíduo – clique aqui para acessar o Formulário de inscrição de voluntários [http://www.fstematico2012.org.br/index.php?link=48] – existem ainda outras duas maneiras de participar:

1.Organizando uma atividade autogestionada durante o Fórum. Veja o texto a seguir.
2.Participando dos debates nos Grupos Temáticos, sobre assuntos relativos à temática em pauta. Veja o texto a seguir.
Para saber, acesse o documento sobre a Proposta Metodológica do Fórum Social Temático. [http://dialogos2012.org/?p=340]


O que são atividades autogestionadas? Quem as promove? Como posso inscrevê-las?
Atividades autogestionadas são as que constituem a maior parte da programação de um Fórum Social. Como seu nome identifica, são ações organizadas por aqueles que as promovem. O Comitê Organizador do Fórum é responsável apenas por receber suas inscrições e definir o local e horário onde acontecerão, porém a preparação, programação, metodologia, materiais e tudo mais que for necessário para sua realização é de responsabilidade daquele que a inscreveu no Fórum. Por valorizarmos a ação coletiva, de acordo com a Carta de Princípios do Fórum Social Mundial, as atividades deverão ser inscritas por grupos, e não por indivíduos. Coletivos, redes, instituições, organizações da sociedade civil organizada estão convidados a fazê-lo. A possibilidade de inscrição está aberta a todos, independente do grau de formalização do coletivo (pode ter ou não um CNPJ), ou de tempo de existência (podem ser coletivos formados com a finalidade de realizar uma atividade autogestionada). Ainda de acordo com a Carta, organizações que tenham finalidade lucrativa e/ou que sejam governamentais ou partidárias não poderão promover atividades. Seus integrantes podem participar como indivíduos apenas.

Sob a temática Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental, qualquer tipo de atividade pode ser realizada. O formato das atividades é aberto. Quem o definirá será seu proponente. Marchas, seminários, teatros, instalações, oficinas, aulas abertas... todas estas e outras mais já foram atividades autogestionadas e podem ser inscritas.
Para inscrever uma atividade, acesse o Formulário de Atividades Autorganizadas clicando aqui [http://www.fstematico2012.org.br/index.php?link=42].

O que são estes Grupos Temáticos de diálogo? Como posso acompanhar seus trabalhos e participar?
Os Grupos Temáticos são grupos virtuais de discussão acerca de assuntos relacionados ao tema “Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental”, que funcionarão por meio de um e-group, e de ferramentas e informações disponibilizadas na Plataforma de Diálogos do Fórum Social Temático.
Os Grupos são um espaço para que organizações, redes, movimentos e intelectuais da sociedade civil organizada possam aprofundar reflexões, construir conexões e elaborar propostas de ação e de documentos. Esta interação contínua no espaço virtual alimentará e será fortalecida por momentos de encontro presencial entre os membros destes grupos, sendo o Fórum Social Temático (em janeiro de 2012) e a Cúpula dos Povos na Rio+20 (em julho de 2012) eventos chave neste processo.

No momento, estão abertas as inscrições para os seguintes Grupos Temáticos: Água; Bens Comuns; Cidades Sustentáveis; Ciência e Tecnologia; Clima; Consumo; Educação; Ética; Extrativismo e Mineração; Governança e Arquitetura de Poder; Territórios, Auto-Governo e Bem Viver.
Para saber mais sobre os trabalhos dos Grupos Temáticos, acesse o menu Grupos Temáticos [http://dialogos2012.org/?page_id=33], na página www.dialogos2012.org

Mais informações, consultar: http://www.fstematico2012.org.br/

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

O BERÇO DA DESIGUALDADE




























O berço da desigualdade. The cradle of inequality. La cuna de la desigualdad. Le berceau de l'inégalité. Brasília: UNESCO, Instituto Sangari, 2009. Foto: Sebastião Salgado.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Ousmane Sembene

Nota:
Os filmes de Ousmane Sembene encontram-se disponibilizados na internet. Os que gostam de baixar arquivos e estão habituados com as ferramentas da informação, não terão dificuldades em adquirí-los. Geralmente com legendas em inglês ou francês, raramente em portugues. A seguir, extraido de sites facilmente identificáveis, uma pequena informação do seu trabalho e principais realizações.

Ousmane Sembene is assuredly one of the most prominent figures in African film and literature. One of Sembène's goals had always been to touch the widest possible audience and at age 40 he decided to become a film maker producing his first film, a short called ‘Borom Sarret’ (1963). During the following year (1964), he made another short film entitled ‘Niaye’. In 1966 he produced his first feature film ‘Black Girl’, the first feature film ever released by a sub-Saharan African director. This French-language film won the Prix Jean Vigo, bringing international attention to both African films generally and Sembène specifically.

Sembène followed this success with the 1968 release of ‘Mandabi’ – the language used in this film was Wolof, the indigenous language of Senegal. Later Wolof-language films included Sembene’s film classic ‘Xala’ (1975, based on his own novel of the same name), ‘Ceddo’ (1977), ‘Camp de Thiaroye’ (1987), and ‘Guelwaar’ (1992). In 1971, Sembène also released the award winning film ‘Emitai’ – this time using the Diola language. His final film ‘Moolaadé’ (2004) won awards at the Cannes Film Festival and the FESPACO Film Festival in Ouagadougou, Burkina Faso.

sábado, 26 de novembro de 2011

Cinema da Guiné Bissau, Flora Gomes.




























Os filmes de Flora Gomes, a meu ver, precisam sempre ser vistos e revistos. Realizador indispensável do atual cinema africano, Flora Gomes dispõe dentre os mais conhecidos na sua filmografia principal: O Regresso de Cabral (1976), A Reconstrução ( 1977), Anos no Oça Luta ( 1978), Mortu Naga ( 1987), Os Olhos Azuis de Yonta( 1992), A Máscara( 1994), Po di Sangue( 1996), Nha Fala( 2002), As Duas Faces da Guerra ( 2007), dentre outros.

Em 2004, o cineasta guineense apresentou em sessão especial na XXXI Jornada Internacional de Cinema da Bahia o filme Nhá Fala (2002). Em novembro de 2011, em homenagem ao DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA, numa sessão de debate, na Sala Luiz Orlando da Biblioteca Pública do Estado da Bahia, seu filme ganha novos olhares e interpretações mediante uma platéia atenta de professores e cineastas que lembram a importância e o valor da história de Moçambique e de Amílcar Cabral. E, que viva Vita, personagem interpretada por Fatou N'Diaye, a mostrar que a herança africana merece sempre ser revisitada.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Cinema Moçambicano, Flora Gomes


(clic na imagem para ampliá-la)

























Relançamento do Filme NHÁ FALA. Uma Comédia Musical de FLORA GOMES . DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA NEGRA.
Atividade do Clube de Cinema da Bahia.

Debate após o filme mediado pelo Prof. Dr.Valdemir Zamparoni, Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos, Ufba/Ceao.

Data: 25 de novembro de 2011
Hora: 14:00 às 16:00
Local: Sala de Projeção Luis Orlando - terceiro andar.
Biblioteca Pública do Estado da Bahia-Barris.

sábado, 29 de outubro de 2011

DAWSON ILHA 10

Lançamento Nacional em 11 de novembro de 2011

DAWSON ILHA 10 A VERDADE SOBRE A ILHA DE PINOCHET
Um filme de Miguel Littín Duração: 100’ Locação: Ilha Dawson e Santiago, Chile Produção: Chile/Venezuela, 2009 / Brasil, 2010

Sinopse

Em 1973, o general Pinochet lidera o golpe de estado que depõe o governo de Salvador Allende no Chile. Os ministros e autoridades depostas tornam-se presos políticos dos militares e são levados para a gelada ilha Dawson, no extremo sul do país, utilizada como campo de concentração da ditadura chilena. Os presos políticos foram submetidos a violentos interrogatórios, trabalhos forçados, constantes torturas físicas e psicológicas. Cristián de La Fuente interpreta um oficial do exército bastante rígido que está encarregado deste grupo de prisioneiros políticos. Benjamín Vincuña interpreta Sergio Bitar, ex-ministro do governo Allende que escreveu o livro Isla 10, no qual o filme foi baseado. Dawson Ilha 10, longa metragem resultante de uma parceria entre Brasil, Chile e Venezuela, apresenta a realidade sofrida pelas vítimas de uma das mais longas e violentas ditaduras da América do Sul.

Sobre Miguel Littín por Antonio Skarmeta
Santiago, 22 de julho, 2009

Miguel Littín teve uma vida excepcional como criador de uma filmografia marcante na história cinematográfica latino-americana. Ele esteve permanentemente comprometido com uma visão autêntica de questões e personagens chilenos, utilizando-se de uma linguagem original e bela. As críticas nacionais e internacionais avaliaram seu trabalho algumas vezes e indicaram-no para Palma de Ouro, em Cannes e para o Oscar em duas ocasiões. Seu filme El Chacal de Nahueltoro é uma inquestionável obra-prima na história da cinematografia mundial e ainda hoje é considerado como uma importante forma de militância contra a pena de morte nos centros internacionais judiciais, universais e políticos que discutem a causa. Actas de Marusia e La Tierra Prometida têm intensamente nos mostrado como Littín vê a história a partir da perspectiva do povo oprimido que luta pela sua dignidade. Ele sabe como se expressar com uma elegância épica. Particularmente, eu gostaria de destacar a visão inspiradora de Littín dos autores latino-americano. Seus trabalhos têm sido adaptados pelo diretor com um alto nível de expressividade e uma complexa síntese dramática. Como no caso de El Recurso del Método de Alejo Carpentier, La Viuda de Montiel e também Alsino y el Cóndor, baseado em Pedro Prado. Ele sabe como gerenciá-los e inserí-los no quadro atual da realidade latino-americana. Como documentarista, Littín é um mestre. O filme que fez no Chile, correndo grandes riscos durante a ditadura de Pinochet viajou pelo mundo ao ponto de um dos ganhadores do Prêmio Nobel de Literatura, Gabriel García Márquez, ter dedicado um livro inteiro para ele: La aventura de Miguel Littín clandestino en Chile. Dawson Ilha 10 é baseado no livro Isla 10 de Sergio Bitar, que foi aprisionado na Ilha de Dawson após o golpe militar. Antonio Skármeta


NOTA: Para quem ainda não teve chance de assistir, o filme do Miguel Littin é imperdível. Lançado no Seminário Internacional de Cinema e Audiovisual em Sessão Especial o ano passado, agora em lançamento nacional a partir do dia 11 de novembro de 2011.

Mais informações:
www.dawsonlapelicula.com e www.dawsonilha10.com.br

sexta-feira, 14 de outubro de 2011



























Pesquisa sobre a Jornada Internacional de Cinema da Bahia(1).

Numa manhã de trabalho na Biblioteca Central da Universidade Federal da Bahia, motivadas pelo ofício de pesquisadoras, trocamos dados sobre pesquisas e estudos que buscam tecer considerações sobre a 38 Jornada Internacional de Cinema da Bahia, suas dimensões de estudo e reflexões sobre um cinema de resistência e por um mundo mais humano.

A jovem professora e pesquisadora, Izabel de Fátima Cruz Melo, apresenta aqui seu olhar sobre o mais antigo evento de cinema do Nordeste e o resistente espaço de debates e reflexões sobre a cinematografia internacional, nacional e local nos últimos decênios, promovidos pela Jornada Internacional de Cinema da Bahia(2).

A seguir:

Blog(3): Conhecemos seu trabalho No meio do caminho tinha uma Jornada, ou era ela o caminho? Jornada de Cinema da Bahia (1972-1978), publicado em 2009 pela Edufba. Por que a escolha da Jornada como objeto de estudo e qual o cenário político-social no qual ela emerge?

Izabel de Fátima Cruz Melo: A minha aproximação com as Jornadas foi oriunda de uma aproximação via estágio de pesquisa na graduação e minha escolha se deu por conta de perceber ali um universo de vivências, histórias que a minha geração sequer sabia existir. O cenário político e social é o da ditadura militar, com todas as restrições de manifestações públicas, cerceadas na base da violência explícita ou simbólica, o que fez da Jornada um dos centros nacionais de resistência cultural e também política à ditadura. Notei na trajetória das Jornadas a emergência e persistência de temas que ainda hoje compõem a pauta das questões relacionadas ao que hoje chamamos de audiovisual, e a sua importância naquele momento como um dos centros de discussão sobre cinema, política e comportamento em suas diversas dimensões.

Blog: Sabemos que há várias dimensões na estrutura do evento. Por sua natureza diversificada e abrangente, apresenta um conjunto de debates, encontros, palestras, promoção de oficinas, sessões especiais, mostras e retrospectivas com renomados realizadores, artistas e admiradores do cinema, entre outras.
Poderia nos oferecer uma análise das principais atividades que se destacaram na Jornada, tomando o período que você elege como baliza para sua pesquisa?

Izabel de Fátima Cruz Melo: Mesmo partindo do recorte dado pela baliza temporal, não é exatamente fácil delimitar quais seriam as principais atividades da Jornada, isso via de regra, depende do olhar, do interesse do pesquisador ao se relacionar com o tema. No meu caso, ao tentar delinear a Jornada, analisando os regulamentos, boletins informativos, jornais da jornada e entrevistas concedidas por participantes do evento, elenquei como principais atividades os Simpósios sobre o curta-metragem que em 1973 derivaram na fundação da ABD (Associação Brasileira de Documentaristas) e na reestruturação do movimento cineclubista; as exibições, que proporcionavam tanto nas mostras competitivas quanto nas informativas e de homenagens, a apresentação de filmes que dificilmente seriam vistos em outros espaços, seja por conta da censura ou por uma distribuição precária que sempre privilegiou filmes de longa-metragens e de nacionalidade determinada e os debates pós- filmes que viabilizavam os momentos mais rememorados nas entrevistas, como espaço de exercício de liberdade de expressão política, cultural, comportamental, etc.

Blog: Vivemos hoje sob a condição da fragilidade dos laços humanos, nos diz Bauman. Observamos que a Jornada trouxe desde sua origem o importante slogan: Por um mundo mais humano. Você poderia situar as principais polêmicas e tensões que a Jornada precisou enfrentar e quais as possíveis respostas encontradas?

Izabel de Fátima Cruz Melo: No período no qual a minha pesquisa está situada, a principal tensão colocada pelo momento histórico era a ditadura militar e os seus desdobramentos, sobretudo, no nosso caso, a censura. As respostas, como coloquei rapidamente na mesa redonda, passaram por estratégias de burla, omitindo informações nos formulários enviados ao Departamento de Censura, formulando documentos públicos com posicionamentos contrários a existência da censura prévia, abrigando filmes com temáticas polêmicas para o período como greve de trabalhadores, tortura, libertação de países africanos do jugo do neocolonialismo, por exemplo.


Blog: Você menciona em seu artigo, resultante de Dissertação de Mestrado, que os relatos obtidos sobre a Jornada, ajudaram a sentir o clima em que eram exibidos os filmes nos espaços culturais de Salvador, na década de 70. Estes momentos memoráveis da Jornada mostram que os enfrentamentos com a censura e as estratégias de burla eram constantes. Poderia comentar a participação dos jovens nestas atividades, quais os registros destas participações?

Izabel de Fátima Cruz Melo: a presença dos jovens é bastante perceptível em todos os espaços e atividades das Jornadas. O trânsito dessas pessoas catalizava o desejo manifestado no regulamento da I Jornada Baiana “incentivar entre a juventude baiana a comunicação artística através da imagem cinematográfica e contribuir para que se abram melhores perspectivas para o curta-metragem na Bahia e no Brasil” . Assim, os encontramos na organização da Jornada, na qual muitas vezes havia a participação de estudantes do curso de Comunicação da UFBA, ou de jovens cineclubistas e interessados em cinema; nos filmes inscritos, sobretudo, mas não exclusivamente, na produção superoitista, responsável por algumas polêmicas temáticas e estéticas nos próprios filmes e também nos debates que resultaram em algumas mudanças nos regulamentos e na inserção de cursos como o dado por Eduardo Escorel sobre o suporte Super -8.

Blog: Os estudiosos e pesquisadores no ofício do seu trabalho, em sua maioria, têm recorrido aos registros em arquivos e mantidos por instituições de guarda dos documentos significativos para a investigação dos seus objetos de pesquisa. Quer dirigindo-se às bibliotecas, às instituições de pesquisa, centros de memória, entre outros, sabemos das dificuldades na preservação e manutenção destes documentos, sobretudo com o advento da nova era tecnológica. Quais seus itinerários na coleta dos dados com o acervo da Jornada e que mecanismos são utilizados para a manutenção e preservação desta memória?

Izabel de Fátima Cruz Melo: Boa parte da minha pesquisa documental no que tange ao que eu chamo dos “documentos oficiais” ocorreu no Setor de Cinema da FACOM/UFBA e no Escritório da Jornada. No período da pesquisa para o mestrado, a documentação estava ainda desorganizada, embora existissem as indicações das caixas, mas dentro dela havia documentos de natureza diferentes e nem sempre alinhados com as datas indicadas. Fiz uso da hemeroteca da Biblioteca Central do Estado da Bahia para a pesquisa dos jornais, que estão em condições preocupantes em termos de conservação. Fui também ao Centro de Documentação e Biblioteca da Cinemateca Brasileira em São Paulo, em busca de alguns programas, jornais e informações que não foram encontradas aqui em Salvador, onde fui gentilmente recebida num acervo altamente organizado e disponível. Entrevistei sete pessoas envolvidas nas Jornadas, na organização, participantes/ cineastas.
Sobre a preservação da memória da Jornada, penso que há a necessidade urgente da criação de um arquivo das Jornadas,que ao meu ver pode estar alocado no próprio Setor de Cinema. Um arquivo que preserve, conserve e disponibilize, não só a documentação escrita, mas também os filmes, coberturas sobre as Jornadas, gravação dos debates, para evitar que mais material se perca.

Blog: A curadoria de um evento da dimensão da Jornada requer uma teia de relações e, na linguagem moderna, uma rede social de interlocutores, participantes e colaboradores. Segundo sua visão, qual o papel exercido pelo curador da Jornada, Guido Araújo?

Izabel de Fátima Cruz Melo: O papel de Guido é de extrema centralidade, e essencial para que a Jornada aconteça. Durante esses quase quarenta anos de Jornada é possível perceber que muitos dos filmes, debatedores e inclusive espaços para que o evento acontecesse dependeram muito das redes mobilizadas por Guido. Podemos elencar como exemplo Cosme Alves Neto e a Cinemateca do MAM/RJ e Roland Schaffner e o ICBA.

Blog: No dia 12 de setembro de 2011, no auditório do Salão Ilha de Maré, Três Olhares Acadêmicos sobre a Jornada, produziram uma fala de prenúncio de vida longa à Jornada. Mesa que reafirmou o valor do evento que presenciamos e participamos. Se os poderes-poderosos continuarem insensíveis ao apoio à próxima Jornada em 2012, os estudiosos, pesquisadores, colaboradores e amigos e amigas da Jornada talvez devessem dizer, como o fez Tuna Espinheira: É de lascar! Triste Bahia! Você concorda?

Izabel de Fátima Cruz Melo: Em torno da continuidade da Jornada há algum tempo uma série de polêmicas que podem ser acompanhadas pela imprensa soteropolitana, inclusive. Penso que é necessário se organizar uma espécie de “força-tarefa” para garantir a continuidade de uns dos eventos de cinema mais antigos em atividade no Brasil.

Blog: Este blog vem mantendo, com certa assiduidade, um diálogo com pesquisadores, estudiosos e interessados na sétima arte ( ver arquivo). Por razões de disposição desta ferramenta de trabalho as postagens permitem apenas uma breve exposição de idéias sobre temas que requerem mais desdobramentos. Quero agradecer a Izabel por ter aceito este diálogo propiciando-nos um conhecimento do seu olhar sobre a Jornada(4).

NOTAS

(1) O banner que ilustra esta postagem foi construído em parceria com João Olivieri e refere-se a Oficina de Cinema da qual participamos, ainda a ser comentada. Por não dispor das imagens fotográficas do evento específico que motivou esta entrevista, decidimos manter o gadget que encontrava-se nos arquivos deste blog.

(2) Izabel de Fátima Cruz Melo _ Licenciada em História pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL); Especialista em História da Bahia pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFES); Mestre em História Social pela Universidade Federal da Bahia (UFBA); Professora da Universidade do Estado da Bahia.

(3) Stela Borges de Almeida_Formou-se em Ciências Socias (UFBA). Professora Adjunta em Sociologia da Educação_Aposentada/Ufba. Doutora em Educação (Ufba/Uff). Blog: Cultura, Política e Cinema http://www.stelalmeida.blogspot.com/


(4) Para este diálogo consultamos dois documentos de referência: o artigo publicado no livro: Ditadura militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes/Grimaldo Carneiro Zachariadhes (org). Salvador: EDUFBA, 2009 e as matérias publicadas no Jornal da Jornada. Por um mundo mais humano. Ano 33. N.33_Setembro de 2011. Estas duas publicações oferecem um conjunto de dados para os pesquisadores e estudiosos da cultura e do cinema.

domingo, 11 de setembro de 2011

E-mail

Nota: sem tempo para um comentário mais detalhado, resolvi postar por e-mail o que presenciei hoje a tarde da programação da JORNADA INTERNACIONAL DE CINEMA DA BAHIA.


Querida Mila,

A programação da Jornada Internacional de Cinema da Bahia deste ano está bombando! (tinindo,dizem os mais antigos). Sem grana e sem apoio financeiro mas com atividades que merecem ampla divulgação e debate. Hoje a tarde fui até a Sala Walter da Silveira para assistir a Trilogia do Veneno, O Veneno está na Mesa do Sílvio Tendler.

Após a exibição do filme a platéia dirigiu-se para o espaço aberto da Biblioteca Pública do Estado da Bahia para o Lançamento da Campanha Nacional Contra o Agrotóxico. Uma platéia, em sua maioria, de jovens estudantes articulados,distribuindo jornais informativos, vestindo a camisa da campanha e divulgando a bandeira: AGROTÓXICO MATA_CAMPANHA PERMANENTE CONTRA OS AGROTÓXICOS E PELA VIDA.

As presenças da Marie Monique-Robin e Catherine Prost garantiram um debate de conteúdo sobre o Cinema x Agrotóxicos e promete multiplicar-se.Os grupos ambientalistas presentes se manifestaram, uma carta de denúncias foi lida.
Na saída do evento Noilton Nunes passou-me o documentário “Em busca da Terra sem Veneno” que será exibido na terça-feira às 20:00 na Sala Walter da Silveira. Pelo que já ouvi de depoimento e do trabalho do Noilton tem tudo para ser divulgado e assistido com atenção.

Envio estes comentários porque acho que vocês precisam multiplicar pelo boca a boca, nas redes sociais, uma vez que os jornais locais sequer colocam notas sobre a extensa, variada e produtiva programação.

Um grande abraço,
Stela

DICAS:

38a JORNADA começou com O VENENO ESTÁ NA MESA, do Silvio Tendler, continuou com O VENENO NOSSO DE CADA DIA, de Marie Monique Robin e segue amanhã terça 13 com EM BUSCA DA TERRA SEM VENENO, do Noilton Nunes. Sala Walter da Silveira, às 20:00h.
TERÇA 9hs haverá também a palestra de HUMBERTO RIOS sobre o Encontro de Documentaristas da America Latina e Caribe que já aconteceu na VENEZUELA, EQUADOR E ARGENTINA. O próximo será no MEXICO.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

www.jornadabahia.com

Jornada promove Oficina de
Produção de Conteúdos Audiovisuais


Os cineasta e produtor de TV Pedro Ortiz e Giuliano Tourino ministram a oficina sobre “Produção Audiovisual Multimídia para Cinema, TV e Vídeo”, pelas manhãs e tardes dos dias 8 e 9 de setembro, no Auditório da Faculdade de Educação da UFBA. A oficina, que tem como foco documentários para web, unindo cinema, vídeo, TV e internet, trabalha com o conceito dos webdocumentártios. As inscrições são gratuitas e podem ser realizadas através do site da Jornada (www.jornadabahia.com).

Diretor da TV USP, Ortiz propõe uma abordagem conceitual e teórica sobre as relações entre cinema, TV e vídeo, a convergência de mídias na era digital, a linguagem e os recursos da produção multimídia. Para isso, utiliza muitos exemplos e também uma pequena oficina prática de produção de webdocumentários e vídeos de bolso com câmeras portáteis, amadoras, digitais, celulares e dispositivos de mídia.

Segundo Pedro Ortiz, é possível realizar produções audiovisuais com poucos recursos e dispositivos acessíveis. “Queremos mostrar que também é possível realizar produções audiovisuais criativas e inovadoras em termos de linguagem com poucos recursos a partir do uso de dispositivos de mídia acessíveis, portáteis, amadores, com ótimos resultados e com inúmeras possibilidades de distribuição nas mídias digitais e redes sociais", afirma o diretor que estréia o documentário "Passageiro(s) da Utopia”, com Dom Pedro Casaldáliga, na Jornada deste ano, no dia 13, às 18h, no Cine Teatro ICBA.


Programa
- O programa é dividido em quatro módulos. O primeiro, “Documentário e as relações entre Cinema, TV e Vídeo”, faz um breve histórico de produções para cinema e TV, experiências na televisão brasileira (Globo Repórter, Hora da Notícia, Documento Especial, Caminhos & Parcerias) e em canais internacionais (BBC - Behind the Lines, BBC Four Documentaries, Frontline - PBS). No segundo módulo, “Produção Audiovisual Multimídia”, Ortiz e Tourino traçam um panorama geral e as principais tendências atuais. Convergência de mídias na era digital: cinema, televisão, rádio, vídeo, internet.

A terceira parte da oficina, “ Linguagem, Narrativas e Plataformas Multimídias”, faz uma abordagem dos recursos tecnológicos e de linguagem e das principais inovações nas narrativas audiovisuais dentro da produção multimídia. Novas formas de produção e de distribuição de conteúdos audiovisuais nas mídias digitais. Finalizando com a “Oficina prática de produção de mini-documentário multimídia”.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011









XXXVIII JORNADA INTERNACIONAL DE CINEMA CHEGANDO EM SETEMBRO!


OFICINA PRODUCAO DE CONTEUDOS AUDIOVISUAIS MULTIMIDIA PARA CINEMA, TV E VIDEOS_ COORDENADA PELOS PROFESSORES PEDRO ORTIZ E GIULIANO TOURINO DA TV USP E DA POS-GRADUACAO CASPER LIBERO-SAO PAULO.

INSCRICAO no SITE www.jornadabahia.com

quinta-feira, 30 de junho de 2011

HYÈNES

Hommage à Djibril Diop Mambéty
Soirée spéciale d'hommage autour des films du réalisateur disparu en juillet 1998.
Vendredi 11 juillet 2008

Hyènes

Sénégal, 1992, 110 min
Scénario et réalisation : Djibril Diop Mambéty
Musique : Wasis Diop
Avec Ami Diakhaté, Mansour Diouf, Djibril Diop, Abdoulaye Diop, Mahouredia Gueye, Issa Samb, Hanny Tchelley
Adapté de La Visite de la vieille dame de Friedrich Dürrenmatt


À Colobane, petite ville endormie dans la chaleur du Sahel, on annonce le retour de Linguère Ramatou qui a fait fortune. Majestueuse et vêtue de noir, Linguère arrive en train. Au premier rang de la foule qui se précipite, Draamaan Drameh, son amour d'autrefois. Linguère décide de faire pleuvoir sa richesse sur la ville, à une condition, une seule: que Draamaan soit condamné à mort, car jadis, il l'a trahie. La foule est consternée.
Pourtant les habitants de la ville n'hésiteront finalement pas à condamner Draamaan, mais la «vieille dame» connaît les foules et leurs faiblesses…

On peut imaginer que Linguère est en fait Anta, l'héroïne de Touki Bouki, partie en bateau tout juste vingt ans plus tôt… et qui revient, chargée de richesse et de douleur… Un film magnifique, présenté en compétition officielle au festival de Cannes, et qui demeurera le testament de ce cinéaste fulgurant, poète et visionnaire, de cet «homme aux semelles de vent», L'«ami africain» irremplaçable, qui avait nom Djibril Diop Mambéty

Nota: há cópia deste filme com legendas em ingles, françês e espanhol. Encontrei este site na internet e deixo aqui para quem se interessar. Tenho uma cópia do filme e considero que vale não só a homenagem ao seu realizador como uma aproximação das lendas e contos senegaleses aqui reconstruídas. Não é simples nem vapt-vupt adentrar-se por esta linguagem narrativa da herança africana, requer esmero, dedicação e retornar várias vezes às imagens preciosas do Djibril. Beleza de filme.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

SÓ A EDUCAÇÃO SALVA

NOTA: vale ler o artigo divulgado hoje sobre a tragédia que vivemos no cotidiano, a seguir.

De: Jorge Werthein
Data: 30 de maio de 2011 09:10:44 BRT
Para: undisclosed-recipients:;
Assunto: artículo de hoy publicado no O Globo
OPINIÃO - ARTIGO
O Globo | Opinião | Link

Só a educação salva

Rio de Janeiro, BR - segunda-feira, 30 de maio de 2011
JORGE WERTHEIN e MIRIAM ABRAMOVAY
A tragédia na Escola Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro, chama a atenção para um fenômeno que vem ocorrendo há muitos anos nas escolas brasileiras: violências de vários tipos. As notícias são reveladoras. Uma professora, no mesmo dia do massacre, ameaçou os alunos com a seguinte frase no quadro-negro: "Fiquem quietos, caso contrário, usarei minha AR-15, de 3,5m de cano, que está em minha bolsa. A arma é automática..." Na Bahia, policiais encontraram armas em mochilas de estudantes. Em Santa Catarina, direção e professores de unidade da rede estadual relatam que um adolescente de 12 anos vem causando transtornos por meio de ameaças e agressões. Ou seja, temos nas nossas escolas violências físicas, verbais, racismo, discriminações, entrada de armas, furtos, violências sexuais, que já fazem parte do cotidiano.
Mas é evidente que Realengo foi a que nos deixou dores mais profundas e também algumas lições. Uma delas revela-se ao nos determos no passado do responsável pelo ataque criminoso que tirou a vida de 12 crianças. As investigações indicam que ele foi vítima de bullying na infância, quando era estudante da mesma Tasso da Silveira, na qual, anos mais tarde, entraria para matar e morrer. Esse tipo de violência acontece frequentemente e pode provocar traumas irreversíveis em suas vítimas. É o que se denomina de microviolência e, na maioria das vezes, passa despercebida pela instituição e nem sequer é considerada como problema.
Há décadas, pesquisadores de várias partes do mundo e do Brasil vêm alertando para a importância de se prestar mais atenção ao fenômeno das violências nas escolas, especialmente a violência intramuros, ou seja, entre estudantes e entre estes e seus professores e outros membros da comunidade escolar. Está provado que o chamado clima escolar prejudica o processo de ensino e aprendizagem e torna as escolas mais vulneráveis.
A solução do problema passa pela ação conjunta de familiares, educadores, governo e sociedade civil, inclusive meios de comunicação. Todos têm sua parcela de contribuição para a formação de meninos e meninas, adolescentes e jovens dentro e fora do ambiente escolar. Os projetos de Convivência Escolar podem vir a mudar situações de violência e as estratégias de intervenção, ao incluir diagnósticos para conhecer a realidade das escolas e tratar de modificá-la. Esses projetos precisam sair do papel, de preferência dentro de um espectro mais amplo, que contemple também o entorno da escola, famílias, vizinhos, polícia. A violência é um fenômeno globalizado, mas costuma ser mais comum em sociedades desiguais, excludentes, menos comprometidas com princípios éticos. Assim, enfrentar a violência envolve enfrentar também desigualdades, discriminações, arbitrariedades, injustiças.
A repressão geralmente aparece como solução mágica, instantânea, em momentos de elevada tensão. No entanto, ela não resolve os problemas internos da instituição escolar. Medidas preventivas, com compreensão e abordagem mais profundas, poderão ter maior efeito no longo prazo. Incluir a questão da violência nas escolas nos cursos de formação de professores, implementar nas escolas programas de mediação que, entre outras ações, promovam o diálogo entre os principais atores do processo educativo e trazer os pais para um diálogo mais sistemático com as instituições de ensino são estratégias que poderiam favorecer uma nova cultura escolar, transformando o cotidiano de risco em cotidiano protetor. Em um ambiente acolhedor, será mais difícil o desenvolvimento de psicopatias e sociopatias. A repressão só faria sentido se tudo o mais falhasse, inclusive a educação como valor.

MIRIAM ABRAMOVAY é socióloga.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Filmografia Africana_PROGRAMAÇÃO

SALA ALEXANDRE ROBATTO – DE 20 A 26 DE MAIO Endereço: Rua General Labatut, 27 – subsolo da Biblioteca Pública dos
Barris


Meninos da África
Dois momentos da filmografia africana guardam em comum os seus jovens protagonistas diante dos conflitos sociais e históricos do continente.

Apoio: Cinemateca da Embaixada da França no Rio de Janeiro. Entrada franca

14h30
As Ruas de Casablanca (Ali Zaoua, prince de la rua,
França/Bélgica/Marrocos, 2000)
Direção: Nabil Ayouch.
Elenco: Hichan Moussoune, Mnounïm Kbab, Mustapha Hansali e Saïd
Taghmaouï. Duração: 90 minutos.
Classificação: 14 anos


17h
Tabataba (França/Madagascar, 1987).
Direção: Raymond Rajaonarivelo.
Duração: 79 minutos.
Elenco: François Botozandry, Lucien Dakadissy, Soatody, Soavelo,
Rasoa, Philippe Nahoun e Jacky Guedan.
Classificação: 14 anos

Sinopse - Em 1947, os habitantes da aldeia de Tanala na costa Este de
Madagáscar, participam de revoltas na grande revolta contra a
colonização francesa. A história da insurreição e da sua repressão é
recriada através dos olhos de Solo, jovem rapaz para quem a vida
cotidiana e a infância não serão nunca transtornadas.



SALA WALTER DA SILVEIRA – PROGRAMAÇÃO DE
27 DE MAIO A 2 DE JUNHO/2011 SALA WALTER DA SILVEIRA
Endereço: Rua General Labatut, 27 – subsolo da Biblioteca Pública dos Barris

Estreia 18h
Cuba, uma Odisséia Africana (Cuba, une Odyssée Africaine, França,
2007).
Direção: Jihan El Tahri
Documentário
Duração: 190 minutos.
Classificação: 10 anos
Entrada franca
Apoio: Cinemateca da Embaixada da França no Rio de Janeiro


Sinopse
- Os soviéticos queriam prolongar sua influência a um novo
continente, os Estados Unidos aspiravam se apropriar das riquezas naturais da África, os antigos Impérios sentiam escapar sua potência colonial e as jovens nações defendiam sua independência recentemente adquirida.Contra o capitalismo, o socialismo ou o colonialismo, estes povos que dispõem, pela primeira vez, do seu próprio país constituem uma espécie de terceiro bloco e combatem em nome de um novo ideal: o internacionalismo como arma para assegurar a independência nacional.Todos os jovens revolucionários africanos, como Patrice Lumumba, Almicar Cabral oAgostinho Neto chamam os guerrilheiros cubanos para lhes ajudarem em sua luta. E a Cuba de Fidel Castro exerce um papel central na nova estratégia ofensiva das nações do terceiro mundo contra o colonialismo dos novos e antigos impérios.
Esta guerra dita "fria" e seus conflitos "por procuração", desde a epopéia tragicômica de Che Guevara, no Congo, até o triunfo da batalha de Cuito Cuanavale, em Angola, Cuba, uma Odisséia Africana conta a história destes internacionalismos cuja a saga explica o mundo atual:eles ganharam todas as batalhas, terminaram por perder a guerra.


De 3 a 9 de junho
Novos documentários africanos. Com o apoio da Cinemateca da Embaixada da França no Rio de Janeiro, estreiam em Salvador dois documentários inéditos no Brasil que lançam nova luz sobre osproblemas e a riqueza natural e cultural do continente africano.

Entrada franca/ Apoio: Cinemateca da Embaixada da França no Rio de Janeiro


Programação
3 a 9 de junho
19h

Atlânticos (Atlantiques, FRA/SEN, 2009)> Direção: Mati Diop.
Documentário
Duração: 15 minutos.
Classificação: 10 anos

Sinopse - À noite, em volta da fogueira num acampamento, Serigne, um jovem de Dakar (Senegal), conta aos seus amigos sua odisséia de clandestino embarcado. Eles ficam desconcertados e se surpreendem com sua coragem, que o conduziu a enfrentar o oceano Atlântico e a morte. Todos escutam aquele que escapou do perigo sem entender perfeitamente o que o levou a embarcar para a Europa, onde a sobrevivência é mais fácil, mas parece ser inalcançável.


Sob as Brumas da Floresta
(Les Brumes de Manengouba, FRA/CAM, 2007)
Direção: Guillaume de Ginestel.
Documentário.
Duração: 52 minutos
Classificação: 10 anos

Sinopse - Em Camarões, no coração do mundo perdido, os habitantes e oscientistas lutam par preservar uma densa floresta tropical cheia de espécies endêmicas de plantas.Um descobrimento recente desvendou um dos escassos santuários, nos quais os habitantes são grandes macacos chamados Drills, uma espécie que deve ser protegida na África. Dentro da encantadora região, descobrimos a riqueza da flora e encontramos uma tribo indígena que luta incansavelmente para preservar sua região dos perigos da floresta.

Nota: Reenvio para os(as) amigos(as) a programação das Salas Walter da Silveira e Alexandre Robatto que foi-me enviada por ADOLFO GOMES, responsável pela sempre cuidadosa seleção de filmografias clássicas e valiosas para apreciação da sétima arte.

sábado, 7 de maio de 2011

site: www.josecalasans.com.br











Nota: Para consulta, estudos e pesquisas, clicar no site www.josecalasans.com.br.



Um bravo combatente

Povoado do Belo Monte, antigo Arraial de Santo Antônio dos Canudos, foi destruído pelas forças republicanas nos primeiros dias de outubro de 1897.

Em 1947, quando das rememorações do cinqüentenário da Guerra de Canudos, o vilarejo, reconstruído no início do século XX sobre as ruínas do arraial conselheirista, recebeu a visita de Odorico Tavares e Pierre Verger. Ambos, jornalista e fotógrafo, fariam uma reportagem para a revista O Cruzeiro que seria um marco nos estudos canudenses. Nela são apresentados os primeiros depoimentos dos sobreviventes do conflito.A História começou a registrar a voz dos vencidos.

Pouco tempo depois, em 1950, José Calasans Brandão da Silva iniciou estudos para elaborar uma tese que privilegiasse a tradição oral sobre a Guerra de Canudos, a vida de Antônio Conselheiro e o Povoado do Belo Monte. Para realizá-la, foi ao sertão, conversou com sobreviventes e compilou preciosas informações que abririam novas veredas para pesquisas sobre o tema.

Com a reportagem de Tavares e Verger e as investigações de José Calasans iniciou-se a oralidade da tragédia sertaneja, até então ofuscada pela grandeza literária do livro Os sertões, de Euclydes da Cunha.

Hoje, mais de cem anos depois da destruição do Arraial de Canudos, dispomos de informações que contemplam os dois lados da bárbara peleja. E muito devemos aos estudos do Professor José Calasans. Suas pesquisas, além de esclarecerem inúmeros episódios da Guerra, tiraram das coxias dos palcos da História as pessoas que ali, às margens do Rio Vazabarris, ouviam ao entardecer as prédicas e conselhos de Antônio Conselheiro.

Armado apenas com a obstinação e paciência do historiador, José Calasans entrincheirou-se nos escombros do arraial conselheirista e foi um dos seus mais bravos defensores.

Claude Santos
Fotógrafo e estudioso da Guerra de Canudos.

domingo, 27 de março de 2011

ENCONTRO COM MILTON SANTOS

NOTA: Transcrevo, a seguir, pela importância e valor, o artigo do cineasta Sílvio Tendler.


DEZ ANOS SEM MILTON SANTOSPor Silvio Tendler, 23.03.2011

No inicio de 2001 entrevistei o professor Milton Santos. A riqueza do depoimento do geógrafo me obrigou a transformá-lo no filme “Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá”. Lá pelas tantas o professor critica a “neutralidade” dos analistas econômicos dizendo que eles defendiam os interesses das empresas que serviam.
Dez anos depois o cineasta Charles Ferguson em seu magnífico filme “Inside Job” esmiúça em detalhes a fala de Milton Santos e revela a promiscuidade nos Estados Unidos entre bancos, governo e universidades. Revela a ciranda entre universitários que servem a bancos e empresas financeiras, vão para o governo, enriquecem nesse trajeto, não pagam impostos, escrevem pareceres milionários para governos estrangeiros induzindo a adotarem políticas que favoreçam o sistema financeiro internacional. Quebram aplicadores e fundos de pensão incentivando a investirem em papéis, que já sabiam, com antecedência, micados. E quando são demitidos das instituições financeiras partem com indenizações milionárias. Acertadamente este filme ganhou o Oscar de melhor documentário de 2011.
Na outra ponta da história está o filme “Biutiful” do Mexicano Alezandro Gonzalez Iñarritu, rodado em Barcelona e narra a vida dos fodidos, das vitimas do sistema financeiro internacional: africanos e chineses que vão para a Espanha para escapar da fome e do desemprego e se submetem a condições de vida sub-humanas. O trabalho do ator Javier Bardem rendeu o prêmio de melhor ator do Festival de Cannes de 2010.
São filmes para ninguém botar defeito e desconstroem as perversidades do mundo em que estamos vivendo.
Em discurso recente em Wisconsin, solidário aos trabalhadores que lutam contra novas gatunagens, o colega estadunidense Michael Moore declarou:
“Vou repetir. 400 norte-americanos obscenamente ricos, a maior parte dos quais foram beneficiados no ‘resgate’ de 2008, pago aos bancos, com muitos trilhões de dólares dos contribuintes, têm hoje a mesma quantidade de dinheiro, ações e propriedades que tudo que 155 milhões de norte-americanos conseguiram juntar ao longo da vida, tudo somado. Se dissermos que fomos vítimas de um golpe de estado financeiro, não estamos apenas certos, mas, além disso, também sabemos, no fundo do coração, que estamos certos.
Mas não é fácil dizer isso, e sei por quê. Para nós, admitir que deixamos um pequeno grupo roubar praticamente toda a riqueza que faz andar nossa economia, é o mesmo que admitir que aceitamos, humilhados, a ideia de que, de fato, entregamos sem luta a nossa preciosa democracia à elite endinheirada. Wall Street, os bancos, os 500 da revistaFortune governam hoje essa República – e, até o mês passado, todos nós, o resto, os milhões de norte-americanos, nos sentíamos impotentes, sem saber o que fazer”.
E arrematou com maestria e indignação:
“…Falei com o meu coração, sobre os milhões de nossos compatriotas americanos que tiveram suas casas e empregos roubados por uma classe criminosa de milionários e bilionários. Foi na manhã seguinte ao Oscar, na qual o vencedor de melhor documentário por “Inside Job” estava ao microfone e declarou: “Devo começar por salientar que, três anos depois de nossa terrível crise financeira causada por fraude financeira, nem mesmo um único executivo financeiro foi para a cadeia. E isso é errado. “E ele foi aplaudido por dizer isso. (Quando eles pararam de vaiar discursos de Oscar? Droga!)”
Esse ano celebramos os dez anos da morte do professor Milton Santos. Quem quiser ler “Por uma Outra Globalização” do Professor Milton Santos encontrará um diagnóstico perfeito do processo de globalização que gestou as mazelas descritas em “Inside Job” e “Biutiful”. Quem quiser reencontrá-lo em “Encontro Com Milton Santos ou O Mundo Global Visto do Lado de Cá”, estará celebrando a vida e o pensamento de um dos maiores pensadores do Século 20, capaz de ter antecipado muito do que estamos vivendo hoje. Sempre com seu sorriso nos lábios e o olhar que revelavam sua clarividência desde o primeiro momento em que começava a se manifestar.

(*) Silvio Tendler é cineasta, diretor de Os anos JK, Jango, Utopia & barbárie, entre outros documentários. Crônica originalmente publicada na edição 420 do Brasil de Fato

sexta-feira, 25 de março de 2011

Mostras do Cinema Africano

NOTÍCIA

Após ter participado como apreciadora de cinema e estudiosa de carteirinha de várias Mostras do Cinema Africano percebi que havia uma lacuna nas minhas indagações e questões sobre o significado desta cinematografia no panorama mundial. Resolvi provocar pessoas que tivessem um conhecimento nesta área e que mostrassem interesse em rever os clássicos do cinema africano para maior reflexão e descobertas. No momento estamos fazendo um levantamento ( inicial e provisório) das principais mostras que contemplam esta cinematografia e decidimos reunir num espaço virtual os nossos achados. Em breve divulgaremos. No momento ainda são buscas provisórias e em parcerias não institucionalizadas, com a competência e participação de amigos(as) que partilham suas descobertas e interesses pela sétima arte.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Jornada Internacional de Cinema da Bahia

Nota: Reenvio para os amigos(as) o correio da Jornada recebido com a programação completa do dia 18 de março de 2011.

LANÇAMENTO OFICIAL

No próximo dia 18 de março acontecerá o lançamento da Convocatória da XXXVIII Jornada Internacional de Cinema da Bahia que sera realizada no periodo de 9 a 15 de setembro vindouro.

A Jornada, com o seu lema de lutar por um mundo mais humano, voltada especialmente para o lado social, realizará este ano o Seminario Internacional A CIDADE INTERPRETADA.

Dentro do tema das Cidades serão abordadas questões a nivel internacional, nacional e local, como o crescimento desordenado, a violencia urbana, o exodo rural, as casas populares em contraponto com os grandes espigões, a utilização e tomada de posse de áreas publicas, a degradação ambiental.

Alem do Seminario Internacional, a Jornada contará com oficinas, exposições, mostras de homenagens e o concurso Afro-Iberoamericano de Filme e Video independente.

O lançamento será no dia 18 de Março às 17 horas, no CINE TEATRO GÓES CALMON, Pelourinho, com a programação que se segue:

Início das Atividades da Pré-Jornada – lançamento da Convocatória da 38ª Jornada Internacional de Cinema da Bahia.

- Palestras de Eliene Bina (diretora do Museu Eugenio Teixeira Leal) e Guido Araujo ( diretor geral da Jornada), seguida das exibições dos curtas-metragens Revivendo Cosme, de Silvio Tendler ; Carta a Zelito, Ao Mestre com Carinho, de Silvio Tendler, e O Capeta Caribe, de Agnaldo Siri Azevedo.

quarta-feira, 2 de março de 2011

As Estatuas Também Morrem- Parte 1

Considerado uma pedra fundamental da vanguarda anticolonialista do cinema françês, este filme realizado por Alain Renais e Chris Marker, em 1953, foi proibido pela censura de 1953 a 1963. A arte africana, especialmente as estátuas e as máscaras, são susbstituidas, pouco apouco, por uma atividade comercial e mercantil, em séries.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Declaração da Assembeia dos Movimentos Sociais

FSM Dacar, Senegal, 10 de fevereiro de 2011


Nós, reunidos na Assembleia de Movimentos Sociais, realizada em Dacar durante o Fórum Social Mundial 2001, afirmamos o aporte fundamental da África e de seus povos na construção da civilização humana. Juntos, os povos de todos os continentes enfrentamos lutas onde nos opomos com grande energia à dominação do capital, que se oculta detrás da promessa de progresso econômico do capitalismo e da aparente estabilidade política. A descolonização dos povos oprimidos é um grande desafio para os movimentos sociais do mundo inteiro.

Afirmamos nosso apoio e solidariedade ativa aos povos da Tunísia, do Egito e do mundo árabe que se levantam hoje para reivindicar uma real democracia e construir poder popular. Com suas lutas, eles apontam o caminho a outro mundo, livre da opressão e da exploração.
Reafirmamos enfaticamente nosso apoio aos povos da Costa do Marfim, da África e de todo o mundo em sua luta por uma democracia soberana e participativa. Defendemos o direito à auto-determinação de todos os povos.

No processo do FSM, a Assembleia de Movimentos Sociais é o espaço onde nos reunimos desde nossa diversidade para juntos construir agendas e lutas comuns contra o capitalismo, o patriarcado, o racismo e todo tipo de discriminação.

Em Dakar celebramos os 10 anos do primeiro FSM, realizado em 2001 em Porto Alegre, Brasil. Neste período temos construído uma história e um trabalho comum que permitiu alguns avanços, particularmente na América Latina onde conseguimos frear alianças neoliberais e concretizar alternativas para um desenvolvimento socialmente justo e respeituoso com a Mãe Terra.

Nestes 10 anos, vimos também a eclosão de uma crise sistêmica, expressa na crise alimentar, ambiental, financeira e econômica, que resultou no aumento das migrações e deslocamentos forçados, da exploração, do endividamento, das desigualdades sociais.

Denunciamos o desafio dos agentes do sistema (bancos, transnacionais, conglomerados midiáticos, instituições internacionais etc.) que, em busca do lucro máximo, mantêm com diversas caras sua política intervencionista através de guerras, ocupações militares, supostas missões de ajuda humanitária, criação de bases militares, assalto dos recursos naturais, a exploração dos povos, a manipulação ideológica. Denunciamos também a cooptação que estes agentes exercem através de financiamentos de setores sociais de seu interesse e suas práticas assistencialistas que geram dependência.

O capitalismo destroi a vida cotidiana das pessoas. Porém, a cada dia,nascem múltiplas lutas pela justiça social, para eliminar os efeitos deixados pelo colonialismo e para que todos e todas tenhamos uma qualidade de vida digna. Afirmamos que os povos não devemos seguir pagando por esta crise sistêmica e que não há saída para a crise dentro do sistema capitalista!


Reafirmando a necessidade de construir uma estratégia comum de luta contra o capitalistmo, nós, movimentos sociais:

Lutamos contra as transnacionaisporque sustentam o sistema capitalista, privatizam a vida, os serviços públicos, e os bens comuns, como a água, o ar, a terra, as sementes, e os recursos minerais. As transnacionais promovem as guerras através da contratação de empresas militares privadas e mercenários, e da produção de armamentos, reproduzem práticas extrativistas insustentáveis para a vida, tomam de assalto nossas terras e desenvolvem alimentos transgênicos que tiram dos povos o direito à alimentação e eliminam a biodiversidade.

Exigimos a soberania dos povos na definição de nosso modo de vida. Exigimos políticas que protejam as produções locais que dignifiquem as práticas no campo e conservem os valores ancestrais da vida. Denunciamos os tratados neoliberais de livre comércio e exigimos a livre circulação de seres humanos.

Seguimos nos mobilizando pelo cancelamento incondicional da dívida pública de todos os países do Sul. Denunciamos igualmente, nos países do Norte, a utilização da dívida pública para impor aos povos políticas injustas e antissociais.

Mobizemo-nos massivamente durante as reuniões do G8 e do G20 para dizer não às políticas que nos tratam como mercadorias.

Lutamos pela justiça climática e pela soberania alimentar. O aquecimento global é resultado do sistema capitalista de produção, distribuição e consumo. As transnacionais, as instituições financeiras internacionais e governos a seu serviço não querem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Denunciamos o "capitalismo verde" e rechaçamos as falsas soluções à crise climática como os agrocombustíveis, os transgênicos e os mecanismos de mercado de carbono, como o REDD, que iludem as populações empobrecidas com o "progresso", enquanto privatizam e mercantilizam os bosques e territórios onde viveram milhares de anos.

Defendemos a soberania alimentar e o acordo alcançado na Cúpula dos Povos Contra as Mudanças Climáticas e pelos Direitos da Mãe Terra, realizada em Cochabamba, onde verdadeiras alternativas à crise climática foram construídas com movimentos e organizações sociais e populares de todo o mundo.

Mobilizemos todas e todos, especialmente o continente africano, durante a COP-17 em Durban, África do Sul, e a Rio+20, em 2012, para reafirmar os direitos dos povos e da Mãe Terra e frear o ilegítimo acordo de Cancún.

Defendemos a agricultora camponesa que é uma solução real à crise alimentar e climática e significa também acesso à terra para quem nela vive e trabalha. Por isso chamamos a uma grande mobilização para frear a concentração de terras e apoiar as lutas camponesas locais.

Lutamos para banir a violência contra a mulherque é exercida com regularidade nos territórios ocupados militarmente, porém também contra a violência que sofrem as mulheres quando são criminalizadas por participar ativamente das lutas sociais. Lutamos contra a violência doméstica e sexual que é exercida sobre elas quando são consideradas como objetos ou mercadorias, quando a soberania sobre seus corpos e sua espiritualidade não é reconhecida. Lutamos contra o tráfico de mulheres e crianças.

Defendemos a diversidade sexual, o direito à autodeterminação do gênero, e lutamos contra a homofobia e a violência sexista.

Mobilizemo-nos, todos e todas, unidos, em todas as partes do mundo para banir a violência contra a mulher.

Lutamos pela paz e contra a guerra, o colonialismo, as ocupações e a militarização de nossos territórios. As potências imperialistas utilizam as bases militares para fomentar conflitos, controlar e saquear os recursos naturais, e promover iniciativas antidemocráticas como fizerem com o golpe de Estado em Honduras e com a ocupação militar em Haiti. Promovem guerras e conflitos como fazem no Afeganistão, Iraque, República Democrática do Congo e em vários outros países.

Intensifiquemos a luta contra a repressão dos povos e a criminalização do protesto e fortaleçamos ferramentas de solidariedade entre os povos como o movimento global de boicote, desinvestimentos e sanções contra Israel. Nossa luta se dirige também contra a Otan e pela eliminação de todas as armas nucleares.

Cada uma destas lutas implica uma batalha de idéias, na que não poderemos avançar sem democratizar a comunicação. Afirmamos que é possível construir uma integração de outro tipo, a partir do povo e para os povos, com a participação fundamental dos jovens, mulheres, camponeses e povos originários.

A assembléia dos movimentos sociais convoca as forças e atores populares de todos os países a desenvolver duas ações de mobilização, coordenadas a nível mundial,para contribuir à emancipação e autodeterminação de nossos povos e para reforçar a luta contra o capitalismo.

Inspirados nas lutas do povo da Tunísia e do Egito, chamamos a que o 20 de março seja um dia mundial de solidariedade com o levante do povo árabe e africano que em suas conquistas contribuem às lutas de todos os povos: a resistência do povo palestino e saharauí, as mobilizações européias, asiáticas e africanas contra a dívida e o ajuste estrutural e todos os processos de mudança que se constroem na América Latina.

Convocamos igualmente a um dia de ação global contra o capitalismo: o 12 de outubro, onde, de todas as maneiras possíveis, rechaçaremos este sistema que destrói tudo por onde passa.

Movimentos sociais de todo o mundo, avancemos até a unidade a nível mundial para derrotar o sistema capitalista!

Venceremos!
Fonte:

Paulo Illes

Coordenador Centro de Apoio ao Migrante - SPM

Declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais
Por: CAMI www.cami-spm.org

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

imagens da diáspora


Durante três séculos, milhões de africanos foram obrigados a sair de suas terras para trabalharem como escravos na América Colonial. O Brasil recebeu a maior parte deles – cerca de cinco milhões de indivíduos. A imensa contribuição africana daí advinda não se limitou apenas ao mundo material, mas influenciou de forma marcante a arte, a língua, a religiosidade, a família e a vida do Brasil. Essa diáspora negra resultou numa experiência inovadora, misturando raças e gerando um povo novo no continente americano. Este livro resgata a trajetória africana no Brasil e ressalta a singularidade e a beleza do legado afro-brasileiro, aqui representado pelo traço inconfundível do trabalho da artista plástica Goya Lopes, acompanhado por textos esclarecedores do historiador Gustavo Falcón.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

sobre o cinema africano

Nota: Excelente texto para os que querem aproximar-se do cinema africano; o enderêço do site para consulta e estudos, a seguir.

BUALA
cultura contemporânea africana

http://www.buala.org/


Papel dos festivais na recepção e divulgação dos cinemas africanos

Há cinquenta anos atrás, o cinema africano nascia e se afirmava como um cinema engajado, comprometido social e ideologicamente com as lutas de emancipação que agitavam toda a África nos períodos da descolonização. Mas depois das independências, novas prioridades afastaram os governos africanos do seu cinema. A partir dos anos 70, os cinemas africanos se tornaram de vez filhos da cooperação cultural que sobretudo a França vem mantendo com as suas ex-colônias. Muitas vozes denunciam os efeitos perversos da política de ajuda francesa nas cinematografias africanas. Paradoxalmente, as críticas mais virulentas partem dos próprios cineastas que vêem nesta forma de apoio um freio e um empecilho à emergência de políticas cinematográficas endógenas. Toda a ambiguidade da ajuda ocidental às cinematografias africanas decorre do fato de que ela carrega boa parte das contradições que cercam as relações do ocidente com o Outro e com essas culturas. Olivier Barlet resume assim o paradoxo da relação da ajuda internacional com os cinemas africanos:
“Os sucessos dos filmes africanos fragilizaram esta cinematografia: há muita pressão sobre os conteúdos e a política de ajuda, ao corresponder a uma necessidade ocidental de imagens do sul, tende para uma adaptação às normas de qualidade internacional.” (BARLET, 1996)

Se a ajuda a uma cinematografia estrangeira é ambígua, precisa o autor, não é porque a transforma numa cinematografia assistida - todo o cinema é, aliás, assistido, inclusive Hollywood. O problema é que esta ajuda é baseada no princípio de um gesto bondoso de um centro em relação ao Outro, à sua cultura e ao seu cinema, isto é, um cinema diferente. Isso não deixa de acarretar consequências no plano temático e ideológico nos trabalhos dos cineastas africanos que se sentem cada vez mais impelidos a conformar os conteúdos de seus filmes às expectativas ligadas a esta “solidariedade” interessada, proveniente de uma grande nação de cultura. Para muitos autores, a cooperação cultural da França com as suas ex-colônias é ainda opaca, ela oscila entre a boa consciência, dever moral, vergonha com o passado colonial e interesse geopolítico.

Há mais de quatro décadas que os recursos da cooperação mantêm viva a produção fílmica na África. Por um lado, isso cria um comodismo nos governos africanos que tendem a considerar o cinema como um setor secundário, e não prioritário, nos esforços de desenvolvimento. Por outro, a ajuda que vem de fora retarda o envolvimento do setor privado local na produção cultural e a emergência e consolidação de uma indústria cultural que seria uma alternativa ao desenvolvimento econômico. Enquanto isso não acontecer, os cineastas lidam como podem com a ambiguidade da política cinematográfica francesa. E na falta de uma política de acompanhamento dos filmes no plano da distribuição, todo o cinema africano se tornou um cinema de evento, um cinema para festivais. À necessidade de ajuda à produção de imagens nos países africanos corresponde uma outra demanda por filmes africanos nos festivais consagrados a esta cinematografia do sul: a distribuição.

Todavia, nesta situação de marasmo e de total entrega das cinematografias africanas às políticas pensadas sob medida para elas e de dependência aos festivais organizados para elas, o Burkina Faso figura como exceção. Não somente pela histórica implicação dos sucessivos governos deste pequeno país da África ocidental na atividade cinematográfica, mas também pela organização do maior evento dedicado, de forma bienal, às produções fílmicas de toda a África e de sua diáspora. Neste texto, nosso objetivo não é denunciar nem fazer uma crítica injusta às diversas formas de ingerência da atividade cinematográfica na África. Ao contrário, pegamos nas contradições da dependência do cinema africano da ajuda, dos festivais e da crítica ocidentais como ponto de partida para um esforço de compreensão do valor de outras experiências endógenas que pontuam a história do cinema africano e que buscam quebrar esta dependência. Nesta perspectiva, o Festival Pan-africano de Cinema e Televisão (FESPACO), a Federação Panafricana dos Cineastas (FEPACI) e os esforços do Burkina Faso por um pan-africanismo no cinema africano devem ser percebidos como alternativas à carência de uma política cinematográfica na África.
CHRONIQUE DES ANNÉES DE BRAISE do argelino Mohamed Lakhdar Hamina (1975).

O cinema africano, um cinema de festival


O cinema africano continua sendo feito com grande dificuldade, mas festivais dedicados exclusivamente a filmes africanos se multiplicam nos quatro cantos do mundo. Estes festivais internacionais, que poderiam alavancar o lançamento comercial dos filmes realizados por cineastas africanos, acabam funcionando apenas como única oportunidade de exibição pública. Os maiores festivais europeus são um termômetro que aferem a saúde do cinema feito na África: quando há mais filmes africanos selecionados no festival de Cannes, por exemplo, isso é percebido pelos críticos como um sinal positivo da dinâmica da produção naquele ano. Ao contrário, a ausência dos filmes africanos da seleção oficial do maior festival do mundo durante dois anos consecutivos foi percebida como um sinal alarmante da situação que vem atravessando o cinema africano ao longo destes cinco anos. A relação obsessiva dos cineastas africanos com os catálogos e os calendários dos festivais confirma uma das exceções do cinema africano: trata-se de um cinema de festival e para os festivais.

Desde que desapareceram os cineclubes, os festivais ocupam o campo de encontro e de debate sobre os filmes de outras partes do mundo. Nascem, portanto, de uma vontade legítima de mostrar filmes que nunca teriam acesso às salas ocidentais (BARLET, 1996). A história dos cinemas africanos é inseparável da existência destes espaços reservados à exibição de filmes provenientes de cinematografias ditas periféricas. Para se fazer conhecer, num primeiro tempo, o filme africano precisou de ir ao encontro dos festivais internacionais. Em seguida, são os festivais que vieram procurar o filme africano pois começava a existir e interessar à curiosidade dos cinéfilos ocidentais. Se Cannes é considerado o maior festival do mundo é, em parte, devido à abertura que seus organizadores fazem às produções provenientes das cinematografias do sul. As mais gloriosas páginas da história do cinema africano foram escritas no Festival de Cannes (DELAFIN, 2007). Desde a sua criação, há mais de 60 anos, o festival francês vem reservando um lugar especial aos filmes de cineastas africanos. O reconhecimento e a consagração do cinema africano começaram com o polêmico Chronicle of the Burning Years (Chronique des années de braise) (Palme d’Or 1975) do argelino Mohamed Lakhdar Hamina. Depois foi a vez do cineasta Souleymane Cissé, do Mali, ganhador do Prémio do Júri, por Brightness (Yeelen) (1987). Dois anos depois Idrissa Ouedraogo, do Burkina Faso, arrebatava o mesmo prestigiado prêmio do Júri com o filme The Law (Tilaï) (1989).

Idrissa Ouedraogo, de Burkina Faso, filme THE LAW (1989) Souleymane Cissé
Além destes premiados cineastas, cabe mencionar os casos de cineastas africanos que frequentam de forma assídua o maior festival do mundo. Os pioneiros foram Paulin Vieyra em 1963 com o seu filme Lamb. Sembène Ousmane apresentou Black Girl (La Noire de…) em 1964. Depois de quase 10 anos, graças ao talento do diretor senegalês Djibril Diop Mambety, o cinema africano voltava para a seleção oficial do Festival de Cannes em 1973, na categoria Quinzena dos Realizadores, com o filme até hoje aclamado pela sua audácia estética Journey of the Hyena (Touki Bouki). O mesmo Djibril Diop Mambety voltou para Cannes em 1992 com o seu segundo longa, Hienas (Hyènes).

Durante todo este tempo, os cineastas do Magreb também contribuíram para o reconhecimento do cinema africano em Cannes. Em 1992 Bezness, um filme de Nouri Bouzid, cineasta da Tunísia, foi selecionado na Quinzena dos realisadores. Depois de ser recompensado com Tanit d’Or do Festival de Cartagena na Tunísia, Halfaouine: Child of the Terraces (Halfaouine) de Férid Boughedir foi selecionado em 1990 na Quinzena dos Realizadores. CHILD OF THE TERRACES, de Férid Boughedir (Tunísia, 1990)

A presença de todos esses cineastas em Cannes simboliza a vitalidade do cinema africano. Durante 15 dias de festival, os filmes africanos são vistos pela crítica internacional e competem com filmes de outros países. Mas além da competição e da consagração, Cannes é também uma formidável oportunidade para os cineastas africanos viabilizarem financeiramente a circulação comercial de seus filmes e tecerem contato com produtores para futuros filmes.

Mesmo não dispondo dos mesmos recursos colossais de Cannes, vários pequenos festivais vêm promovendo filmes africanos no exterior. Seus organizadores se contentam, geralmente, com o público formado pelos habitantes de uma determinada localidade que não são forçosamente cinéfilos nem conhecedores do cinema africano1.
BEZNESS, de Nouri Bouzid (1992)

Estes eventos de pequeno porte estão inscritos na agenda de todos os cineastas africanos. É o caso de Afrika Filmfestival. Ocorre anualmente, desde 1996, na cidade de Louvain. A projeção dos filmes e vídeos de África e da diáspora nesta província belga determinou, inclusive, as formas de promoção e de cooperação entre a Bélgica, a região do Brabant flamengo e a África. Para os organizadores, o objetivo é duplo. Permitir, num primeiro momento, ao público ocidental descobrir “a maneira como os próprios africanos se vêem e julgam sua situação, sua história e seus contatos com a Bélgica (Europa)”. Isso favorece um maior diálogo e compreensão entre ambos os lados. Cada ano o Festival de Louvain desenvolve temáticas sócio-culturais que giram em torno da migração, da situação das mulheres africanas no cinema e o passado colonial belga. O segundo objetivo é mais humanitário. Além da programação normal dos filmes africanos em salas de cinema e centros culturais, o festival tem atividades ligadas à cooperação ao desenvolvimento:
“As vozes e as imagens dos colaboradores africanos das instâncias oficiais e não oficiais (ONG) se fazem ouvir ou ver. Pela criação de canais de distribuição e de representação para os produtores de filmes africanos, o festival tenta contribuir para a manutenção desta produção cultural.” (CONVENTS, 2003)

O que todos estes festivais têm em comum é a postura política e militante que caracteriza a ação de seus organizadores. Demonstra uma vontade de passar de um sentimento de curiosidade, de benevolência e de exotismo em relação aos filmes africanos para uma relação espectatorial mais engajada que, em alguns casos, beira o terceiromundismo. Festivais como o African Film Festival (USA), o African Diaspora Film Festival (USA), o Afrika Film Festival (Bélgica) e o Festival de Cannes têm um mesmo objetivo: contornar o insolúvel problema de distribuição e circulação dos filmes africanos e promovê-los junto às populações ocidentais.

Mas a excessiva importância dos festivais fez com que eles acabassem determinando o valor de um filme e as opções estéticas e temáticas dos cineastas africanos. Muitos filmes africanos premiados são acusados de “cultuarem falsos valores e lugares comuns que dão uma imagem artificial e truncada da África.” (VIEYRA, 1975). O peso dos festivais no percurso de um filme africano é hoje objeto das mesmas críticas feitas ao desvirtuamento das cinematografias provocado pela ajuda financeira da cooperação internacional. Férid Boughedir atribui os problemas estéticos do cinema africano contemporâneo àquilo que chama de “festivalidade”, isto é, a atitude que leva os cineastas africanos a formatar os seus filmes às normas e às expectativas do público dos festivais (no fundo, o seu único público) (BOUGHEDIR, 2005). Os cineastas africanos são reféns da “religião que é a cinefilia”. Ora, quando se sabe que o “cinéfilo não gosta forçosamente de um filme pelo que o diretor quis dizer, mas pelo que ele (cinéfilo) quer encontrar neste filme”, é como se todo o cinema africano fosse refém do olhar e das expectativas espectatoriais ocidentais. Sendo assim, várias gerações de cineastas africanos, acabaram por confundir pesquisas estéticas reais com puro estetismo para agradar os críticos ocidentais.
TOUKI BOUKI, de Djibril Diop Mambéty (1973)

As relações ambíguas da crítica eurocêntrica com os filmes africanos
O papel da crítica ocidental tem sido tão decisivo quanto o dos festivais na divulgação, compreensão e aceitação das imagens provenientes da África. A crítica europeia soube bem cedo identificar e circunscrever a recorrência de grandes características temáticas e estéticas no cinema africano. Mas, pode-se dizer também que, ao longo da história dos cinemas africanos, a crítica ocidental elaborou e projetou as suas próprias representações imaginárias sobre as produções fílmicas africanas. A leitura ideológica da crítica eurocêntrica ora cria novos preconceitos, ora não dá mais conta das novidades nos cinemas africanos. Há uma descontinuidade entre as novas temáticas abordadas nos filmes africanos e os horizontes de expectativas dos críticos.

A crítica, como as demais áreas de produção de conhecimento, pode ser portadora da ideologia do seu contexto cultural de produção. A crítica ocidental não escapa desta regra. Como reconhece Barlet, não escapa do preconceito ambiente (BARLET, 1996). Muitas vezes os olhares e as leituras ocidentais sobre as imagens produzidas pelos artistas africanos criam e reforçam a diferença. A relação dos ocidentais com a criação dos artistas dos países do sul permanece terrivelmente marcada por uma atitude neocolonialista que os faz exigir uma “autenticidade” desses artistas. Isso passa por uma flagrante ignorância da existência de uma arte contemporânea e a recusa de uma expressão autônoma que não corresponda às expectativas exóticas ocidentais.

De acordo com Olivier Barlet (BARLET, 1997), duas significações balizam toda a leitura aplicada aos filmes africanos pela crítica francesa e europeia de modo geral: a ingenuidade e a irreflexão. Nos anos 80 os filmes africanos tiveram uma maior visibilidade graças a Festivais e ao interesse da cinefilia ocidental sedenta de uma nova estética cinematográfica. Os filmes de Souleymane Cissé e de Idrissa Ouedraogo2 são incensados pela magia, a “ingenuidade” e o “lado primitivo” que os caracterizam. Na verdade, a suposta ingenuidade do cinema africano decorre de uma apreciação simplista por parte da crítica francesa, incapaz de compreender as imagens produzidas pelo outro. Para o ocidente, a África sempre foi o Outro, um cenário de projeção, o suporte de estereótipos do imaginário coletivo decorrente do cinema colonial: os negros são bons selvagens, eternos festivos antimaterialistas que vivem unicamente do calor social, grandes crianças que, como lembrava o Larousse de 1932, “sua inferioridade intelectual nos impõe proteger (BARLET, 1997)”.
Naquela década de 80, o cinema africano é, ao mesmo tempo, objeto de fascínio e desdém da crítica. No plano cinematográfico a diferença e o exotismo elogiados nos filmes africanos, na verdade, funcionam como um repertório de clichês que impedem um maior exercício crítico para apreender as mudanças que já estão em curso em todas as cinematografias africanas. A condescendência da crítica francesa, de acordo com o autor, assemelha-se à incapacidade de se exercer uma reflexão profunda para apreender os filmes africanos naquilo que têm de singular e universal.

Destas duas atitudes na recepção eurocêntrica decorre a definição do cinema africano como gênero. A leitura da crítica ocidental é reducionista e globalizante. O cinema africano é visto como um todo, independentemente das idiossincrasias que podem se encontrar nos trabalhos dos cineastas africanos em termos de estilo, de gênero e de temática. À recepção ingênua do cinema africano dos anos 80 sucede uma crítica incompreensiva da mudança que atravessa todas as cinematografias africanas e as novas propostas e temáticas abordadas pelos cineastas africanos. A crítica francesa, como lamenta Barlet, continua classificando os filmes africanos na categoria distintiva e globalizante de “filme africano”. Além de reduzir os trabalhos dos cineastas africanos a esta categoria, a crítica não tolera mais o que ela considera a imaturidade do cinema africano e que ela continua tentando apreender por uma única ótica da dicotomia “filmes de cidade vs filmes de campo” que ela mesma criou.
Mesmo se Olivier Barlet prega uma leitura mais subjetiva dos filmes africanos, que possa restituir-lhes esta condição de igual, o cinema e as imagens vindas da África continuam esbarrando nos critérios elaborados pelos discursos valorativos ocidentais. A reflexão crítica, principalmente a francesa, parece ter engessado a análise temática dos filmes africanos. Ingenuidade, filme de gênero, o olhar ocidental sobre os filmes de África os enclausura em critérios redutores que lhes negam a sua estética própria. Isso seria o resultado de uma leitura tipicamente eurocêntrica que consiste em apreender as produções culturais do sul pela única ótica do “Outro”. Proclama-se a diferença do “Outro” antes de aceitar a sua diferença. Para Barlet, não há dúvida que o velho princípio de diferença estabelecido entre cinema africano e cinema ocidental penetra e compromete a atividade crítica e a percepção dos próprios filmes.

Os filmes africanos só começam a ser apreciados essencialmente como são, isto é, como imagens decorrentes de uma outra cultura (e não de uma cultura imaginada e pré-fabricada pelo ocidente) quando emerge um novo público que não compartilha das categorias da crítica eurocêntrica. Para Barlet, “urge estabelecer uma diferença entre grandes e pequenos festivais percebidos como “predadores”, dos festivais que permitem uma efetiva promoção comercial dos filmes junto à mídia e aos profissionais do cinema”. Os próprios cineastas africanos aprenderam, com o tempo, a distinguir entre festivais que brilham pela inteligência da sua programação feita de retrospectivas, seminários e atividades culturais, dos eventos que se destacam por um paternalismo que arrepia e em que a exibição de um filme africano se aparenta a uma ação humanitária (BARLET, 1996).

Por outro lado, é bom notar que em todos estes festivais internacionais as produções africanas são selecionadas e apresentadas como um todo, sob o termo genérico e globalizante de “festival de cinema africano”, independentemente das diversidades e das origens dos próprios cineastas. É difícil imaginar um festival sobre o cinema americano, como o de Deauville, em que encontrar-se-iam, lado a lado, filmes estadunidenses, argentinos, brasileiros ou mexicanos. Inclusive, mesmo quando há um festival sobre o cinema latino-americano os organizadores e o público esperam ver uma variedade de propostas fílmicas que refletissem a diversidade de situação do cinema sul-americano. Com os festivais de filmes africanos, o critério de diversidade não parece ser aplicado. Tudo acontece como se os cineastas africanos participassem de um mesmo movimento cinematográfico oriundo de um mesmo “país”, compartilhassem das mesmas preocupações políticas, estéticas e temáticas. Espera-se dos filmes e dos cineastas africanos uma única e mesma realidade: a África. Os cineastas africanos são os primeiros a fustigarem a atitude reducionista dos críticos ocidentais que não se dão ao trabalho de distinguir a proveniência dos filmes africanos em seus artigos. Esta crítica dos cineastas africanos vale para os organizadores de festivais? Se não há ainda um festival dedicado à cinematografia de um país africano em particular, isto se deve à fraca quantidade de filmes produzidos por país, bem como a características temáticas e formais que seriam comuns a todos os filmes africanos. Mas, por trás desta visão globalizante, há a concepção ocidental de que a África é una. Ora, como sabemos, não há um cinema africano como tampouco há uma África. O próprio Magreb que está dividido entre três países (Argélia, Tunísia e Marrocos) está longe de constituir uma entidade apesar do substrato cultural árabe-islâmico que têm em comum. Portanto o cinema africano não se restringe aos filmes produzidos na África subsaaariana. Inclusive a participação dos cineastas das diásporas negras e magrebinas dos movimentos cinematográficos africanos não é mais vista como uma extrapolação indevida.

Por uma recepção diaspórica dos filmes africanos

Outros festivais e eventos procuram criar uma ponte entre as criações africanas e um público formado pela diáspora negra e africana. Todas as diásporas, como sabemos, estão engajadas num processo de reconstrução daquilo que Anderson Benedict chama de “comunidades imaginadas”3 (HALL, 2003). A relação dos negros ou das populações originárias do norte da África com a terra de origem de seus ancestrais passa, doravante, não somente por uma reconstrução de uma nova “identidade cultural” no além-mar, mas também pelas experiências estéticas proporcionadas pelo contato com as manifestações artísticas e culturais provenientes do continente negro. Os eventos em torno das imagens provenientes da África (cinema ou fotografia) tomam os aspectos de uma mediação cultural em que a experiência de re-identificação simbólica com as culturas africanas opera-se pelo contato com as representações cinematográficas que destacam a presença da herança cultural negra na tela.

A recepção diaspórica do cinema africano problematiza e, ao mesmo tempo, ajuda a entender muitos aspectos da dimensão cultural que se sobrepõe à dimensão estética nos filmes africanos. Se a realização dos filmes por diretores africanos parece proceder diretamente dos esforços para a construção simbólica do conceito de nação pela auto-afirmação através da imagem, o uso destes filmes africanos por uma parte da diáspora africana parece também determinado por fatores de ordem étnica e política (ODIN, 2000)4. A relação da diáspora negra ou norte africana com o cinema e as imagens provenientes da África toma a forma de uma prática de “recepção cultural” (KESSLER, 2000)5, pois os filmes africanos, enquanto manifestações culturais geograficamente marcadas, passam a ser objeto de um novo investimento semântico que supera, muitas vezes, o conteúdo narrativo. Os eventos culturais organizados em torno do cinema africano (que, muitas vezes, incluem a literatura e o artesanato) nos colocam diante de uma situação de prática espectatorial em que novas particularidades culturais determinam os modos de leitura dos filmes africanos. Como os filmes e o público são selecionados e visados na base do critério étnico, há, por parte do público da diáspora, a mobilização de modos de leitura particulares. Assim, um mesmo filme africano poderá ser diversamente interpretado conforme é projetado para um público ocidental num festival na Europa ou para um público negro no contexto de um festival organizado pela diáspora africana.

Outros festivais vão mais longe nesta empreitada de aproximar a África das suas diásporas. Eles integram na sua programação, além dos filmes propriamente africanos, filmes provenientes das próprias diásporas. Este tipo de ponte entre os dois mundos confirma, às vezes, a própria vitalidade das cinematografias provenientes das diásporas negras e árabes.
As políticas e ideologia das programações dos festivais confirmam, desta forma, a emergência de um público cinematográfico diaspórico no meio da história dos cinemas africanos.
BLACK GIRL de Sembène Ousmane (1964)

Por um festival africano

Paralelamente a estes festivais ocidentais, os africanos sentiram, num determinado momento da sua história, a necessidade de organizar seus próprios festivais. Seriam espaços de exibição de filmes em terra africana, que propiciassem a oportunidade para federar os cineastas africanos e os da diáspora em tornos de ideais e valores coletivos. Grandes ou pequenos, estes festivais africanos permitem um contato entre os filmes, os cineastas africanos e seus públicos locais. Os cineastas africanos, então, impõem-se uma escolha no momento da primeira exibição do seu filme: ou procuram por grandes festivais promocionais (Cannes, Berlin, Veneza) - neste caso estariam privilegiando uma notoriedade e uma maior visibilidade internacional para os seus filmes - ou, ao contrário, apostam num reconhecimento africano e optam por exibir seus filmes nos festivais panafricanos (Ouagadougou, Cartagena), privilegiando o público local.

Desde a resolução apresentada pelo Groupe Africain de Cinema, que se concretizou pela organização do primeiro festival mundial dedicado às artes negras, que ocorreu em 1966 em Dakar, os grandes eventos culturais na África têm sido parte dos desafios e das prioridades dos artistas, cineastas, intelectuais e governos. O Festival de Dakar se transformou, pela circunstância, num palco para a primeira exibição pública dos primeiríssimos filmes que acabavam de ser realizados por cineastas africanos.6 O festival das artes negras, é bom lembrar, constitui um marco na história da cultura africana nesse período pós-colonial. É uma espécie de coroamento e consagração do pensamento e idéias estéticas desenvolvidas pelos autores que idealizaram o movimento da negritude7. A organização de um festival dedicado à celebração das artes negras tinha um caráter altamente político, pois através desse encontro procurava-se reconciliar a África com ela mesma depois de séculos de escravidão e de colonialismo. Nesse primeiro encontro cultural em solo africano, o objetivo era duplo: reunir e juntar os artistas negros ou de origem africana com aqueles que vivem no resto do mundo, a fim de permitir uma confrontação e um retorno às fontes e afirmar a unidade da arte negra na sua diversidade. Mas, por outro lado, buscava-se enfatizar a contribuição cultural do negro. No seu discurso inaugural, o então Presidente do Senegal e um dos idealizadores da negritude, Leopold Sedar Senghor, afirmava a respeito da arte negra: “são os europeus que a descobriram, os negros africanos preferiram vivê-la, e são os artistas e escritores europeus, de Pablo Picasso a André Malraux, que a definiram”. Doravante caberia aos próprios negros africanos definirem os contornos e as características estéticas e filosóficas da arte negra.

Senghor, mais tarde no seu discurso de abertura do colóquio sobre a “arte negra na vida do povo”, declarava que o Festival das artes negras visava, antes de tudo, à “elaboração de um novo humanismo que, desta vez, inclui a totalidade dos homens sobre a totalidade de nosso planeta Terra”. Embora o evento fosse exclusivamente reservado à afirmação da força e o valor das manifestações negras e africanas, não há dúvida de que o humanismo e o universalismo que alicerçavam as teses de Senghor sobre a negritude o obrigassem, de certa forma, em conceber o festival como uma ocasião onde se realizava o seu sonho de “se chegar a uma melhor compreensão internacional e inter-racial”. Por outro lado, Senghor aproveita essa oportunidade para “afirmar a contribuição dos artistas e escritores negros das grandes correntes universais de pensamento e permitir aos artistas negros de todos os horizontes ‘confrontar os resultados de suas pesquisas’”. O cinema africano ainda não existe de fato na época em que as bases teóricas da negritude são lançadas. Porém, o ideal da negritude se encontra no centro das primeiras aventuras cinematográficas africanas. O cineasta africano, assim como os demais artistas, é convocado a ter um compromisso com a cultura local, mas sem esquecer que sua obra deve se inserir no diálogo das culturas e participar de um universalismo das civilizações que, como sabemos, será criticado por algumas correntes da teoria pós-colonialista.
BAB SEBTA, filme de Pedro Pinho e Frederico Lobo (2008)

FESPACO: um festival panafricano para um cinema africano.

O sonho de federar os cineastas africanos em torno de um mesmo evento cultural teve sua manifestação mais expressiva e simbólica na criação do FESPACO. O Festival Panafricano de Cinema e da Televisão de Ouagadougou nasce de um esforço conjugado de um grupo de cineastas africanos com o apoio do governo de Burkina Faso. É um caso raro e bem sucedido de parceria entre instâncias públicas e cineastas naquilo que poderia ter servido de exemplo de política cinematográfica na África.
Ao ajudar a criar o Festival de Ouagadougou em 1970, o governo de Burkina Faso não visava apenas dar uma vitrine internacional à produção fílmica do seu país. Pretendia transformar este evento cinematográfico no maior espaço de encontros e de intercâmbio entre os cineastas de todos os países africanos. Se é verdade que a maioria dos filmes selecionados e premiados não conseguem ser distribuído nas salas de cinema africanas, o FESPACO tem o mérito de ser popular junto dos habitantes de Ouagadougou que, em situações normais, não se empolgam com os filmes africanos: “em uma semana eles assistem, entusiasmados pelo evento, um número impressionante de filmes. Às vezes difíceis e legendados, projetados em todas as salas da capital” (BARLET, 1996).

As ambições panafricanistas do FESPACO transcendem os limites do Burkina Faso, país anfitrião. Os seus organizadores o concebem como uma grande missa para celebrar todos os cinemas e a imagem da África e da diáspora negra. É no próprio prêmio do Fespaco que muitos reconhecem claramente as ambições panafricanistas do maior festival dedicado ao cinema negro-africano sobre solo africano. Em 1972, os organizadores do Festival Panafricano do Cinema de Ouagadougou instituíam o prêmio l’Étalon de Yennenga. Este prêmio recompensa o longa-metragem que, além das suas qualidades técnicas, foi o que melhor descreveu as realidades da África. A cada edição do Fespaco, e através deste prêmio, espera-se dos cineastas africanos filmes que apresentem uma imagem justa do continente negro, isto é, uma imagem que não deva ser necessariamente angelical, mas tampouco estereotipada. Stanislas B. Meda (2006) dedicou uma tese de doutorado ao prêmio do FESPACO, com o seguinte título: « o filme africano diante da competição: análise dos prêmios Étalon de Yannenga de 1972 a 2005 ». Ele parte de uma análise dos diferentes filmes premiados para chegar a grandes características comuns a todos eles. De 1972 a 2005, diz o autor, as obras que chamaram a atenção do júri são filmes que denunciam mazelas culturais e todos os tipos de freios a qualquer desenvolvimento na África. Enquanto alguns filmes estigmatizam a ação colonial ou dos missionários, considerada como « fator de inibição dos valores positivos da África », os outros valorizam o passado glorioso de uma civilização já aniquilada pelos efeitos da dominação estrangeira e a aculturação (MEDA, 2006).

Os objetivos do FESPACO permanecem, em muitos aspectos, a defesa da expressão mais concreta do panafricanismo que domina todas as produções artísticas africanas8. Com o passar do tempo, em virtude destes objetivos federativos, o Festival abriu suas portas para produções cinematográficas provenientes da diáspora negra. Os ideais políticos e ideológicos da FEPACI e do FESPACO refletem a missão que os cineastas africanos se atribuem.

O duplo compromisso dos cinemas africanos: construção identitária nacional e defesa do panafricanismo.

Na gestação dos estados-não-nações da África assistimos a uma espécie de imbricação do modo de representação cinematográfica com os modos de produção de imagens e ideais próprios que cada governo tenta forjar no plano local. Os cinemas africanos surpreendem os projetos de construção nacional na sua gênese e na sua fase mais política e ideológica do que cultural. MUEDA, MEMÓRIA E MASSACRE, de Ruy Guerra (Moçambique, 1979/80)Este encontro começou no momento da descolonização e prosseguiu com o período das independências quando muitos novos estados africanos viram no cinema uma forma de expressão artística e política de sua soberania no plano simbólico. Foi na África do norte, particularmente no Egito e no Magrebe, que o movimento de “descolonização” da história e das consciências pelo cinema foi mais intenso. A revolução nasseriana de 1953 traduziu-se em uma radical investida nacionalista na área cultural e cinematográfica. As sucessivas tentativas de nacionalização das empresas cinematográficas no país, a partir de 1962, desembocaram na criação de um organismo geral do cinema e da televisão responsável por toda a cadeia produtiva do cinema. O cinema egípcio passou a ser administrado pública e ideologicamente pelo estado. A intervenção nacionalista do governo de Nasser no cinema egípcio inaugurou o modelo de produção estatal no país. Mas não eliminou totalmente os empreendimentos das iniciativas privadas que, desde os primeiros anos da história do cinema egípcio, permitiram a emergência de um embrião de modelo de produção industrial. Com a construção de grandes estúdios com Ramsès, o cinema egípcio destacou-se na produção de filmes de gênero musical com enredos que lembra os filmes de Bollywood e que continua fazendo a sua fama na África e no resto do Oriente Médio e em todo o mundo árabe.

Med Hondo, da MauritâniaDiferentemente do Egito (onde a nacionalização foi precedida por uma gestão privada do cinema), a história do cinema em boa parte de outros países africanos começa com um envolvimento dos jovens estados africanos na cadeia de produção e distribuição. Os primeiros africanos produzidos com a ajuda de seus governos africanos tiveram como vocação destilar imagens positivas da África e acabar com a dominação colonial pela imagem. Com Soleil Ô (1970), o diretor Med Hondo de Mauritânia realizava não somente um filme poético em forma de ode às belezas da África, bem como se livrava a uma crítica da colonização, o que confere a este filme um caráter altamente político.

Desde o início da independência, todos os jovens governos africanos priorizam a promoção do cinema em suas agendas. Alguns países começaram nacionalizando ou controlando o circuito de importação e distribuição dos filmes e programas audiovisuais.
Posteriormente organizaram o seu próprio mercado audiovisual nacional para assegurar um auto-financiamento das produções locais. O modelo vigente era, então, a gestão pública da cadeia produtiva. O sucesso da nacionalização do cinema em Burkina Faso em 1969, na Argélia e na Guiné Conakry encorajou outros estados africanos a nacionalizar o setor cinematográfico. O Senegal decretou um monopólio nacional de importação de filmes em 1974, enquanto países como Benin, Madagascar, Somália, Congo e Sudão criaram organismos públicos para organizar o mercado da importação e distribuição de filmes. No entanto, foi em Burkina Faso que a implicação do Estado na gestão da atividade cinematográfica foi mais sistemática e seguiu princípios políticos e ideológicos claros. O interesse dos sucessivos governos deste pequeno e pobre país da África ocidental por seu cinema o transformou num caso excepcional.

O cinema em Burkina Faso: um caso à parte


Historicamente o Burkina Faso é um caso atípico nas cinematografias dos países africanos subsaarianos. É o único país que mantém um esforço constante para sustentar e viabilizar a atividade cinematográfica. Na antiga Alta-Volta (hoje chamado Burkina Faso), o governo cria a partir de 1961, um ano após a independência, um setor dedicado exclusivamente ao cinema dentro do ministério da comunicação. Em agosto de 1960, realizou-se o primeiro cinejornal do país, À minuit l´indépendance (À meia-noite a independência). Como o nome indica, esse filme registrava de forma documental as cerimônias que precederam a proclamação da independência do país. Mais tarde, este primeiro setor cinematográfico estatal no Burkina Faso seria responsável por toda a gestão do cinema no país, notadamente com a produção de filmes essencialmente educativos e de divulgação agrícola e sanitária junto à população rural. Mesmo com estrutura de produção precária e com poucos técnicos, o Burkina Faso já havia realizado 26 filmes em dez anos de independência. A maioria desses filmes eram curtas-metragens (30 a 40 minutos): 7 documentários de “interesse nacional” e 19 filmes pedagógicos. (VIEYRA, 1975)

Em 1970 o estado participa intensamente do mercado cinematográfico do país. Depois de um desentendimento com as empresas de distribuição francesas (Secma e Comacico), o governo da época nacionaliza todo o setor, inclusive, passa a controlar as salas de cinema, antes de criar uma empresa nacional de distribuição e comercialização dos filmes (Sonavoci, depois transformada em Sonacib). Essa gestão pública do circuito de exibição naquela época se traduziu por um esforço de melhoramento das condições das salas de cinema existentes no país. As tentativas de elaborar uma política de auto-gestão do cinema nacional contribuíram para fazer do Burkina Faso um caso excepcional na África negra. Ao exonerar os filmes africanos de qualquer tributação, o governo conseguiu aumentar em 25por cento as receitas do setor. Os impostos cobrados dos filmes estrangeiros permitiram “a este país pobre de ter um dos cinemas mais dinâmicos do continente” (BARLET, 1996). Cabendo à empresa estatal, Sonacib, repassar 15por cento deste imposto a um Fundo de Promoção e de Extensão da atividade. Este fundo foi responsável, durante muito tempo, pela produção de vários filmes do Burkina Faso. Mesmo com as recentes dificuldades da Sonacib devido à queda da receita de bilheteria nos cinemas, este modelo de controle público do setor cinematográfico distingue o Burkina Faso do restante da África ocidental, onde todo o circuito de distribuição e de exibição continua nas mãos de grupos estrangeiros (libaneses e franceses).

EU, UM NEGRO, Jean Rouch (1959)
Nos anos 80, com a chegada de um militar no poder e a instauração de uma revolução cultural9, os esforços do governo de Burkina Faso com o seu cinema tomam, muitas vezes, dimensões ideológicas mais profundas. Com o governo revolucionário instaurado pelo presidente-militar Thomas Sankara, o cinema nacional, e juntamente com ele, o FESPACO, passou a ter maior ressonância, pois correspondia aos anseios políticos e ideológicos do momento, isto é, uma forma de resistência àquilo que se considerava ainda como resquícios do colonialismo e do imperialismo ocidental francês na África, mas também um modelo de integração cultural dos povos africanos. Hoje, os esforços do Estado de Burkina Faso estão voltados para a formação de profissionais do cinema e do vídeo, notadamente, com a criação do Instituto Regional da Imagem e do Som (IRIS). Um dos raros centros de formação audiovisual na África ocidental, recebe estudantes e professores provenientes de todos os países da sub-região.
Esta implicação ideológica do Estado de Burkina Faso com o cinema o transformou no palco privilegiado de grandes encontros realizados entre cineastas e intelectuais para debater medidas e resoluções que viabilizassem a adoção de políticas cinematográficas na África. Não é à toa, portanto, que este país foi palco de lançamento das bases da criação da federação panafricana dos cineastas. A FEPACI é, até hoje, a máxima concretização do sonho de panafricanismo que anima os pioneiros do cinema africano. O cinema exige um trabalho coletivo, é um processo de criação conjunto. Os cineastas africanos entenderam cedo que poderiam ser parceiros na discussão de diretrizes e políticas junto aos governos. A história do cinema africano é pontuada de experiências associativas que exprimem esta vontade de superar os obstáculos e participar de processos políticos de forma coletiva. O esforço dos cineastas africanos de se organizarem no período da descolonização traduz, como lembra Clément Tabsoba, “o engajamento dos cineastas do continente negro para um combate anti-imperialista (TAPSOBA, 2005)”. Paulin Soumanou VieyraPaulin Soumanou Vieyra e outros cineastas ao criarem o “Groupe Africain de Cinema” em 1952 tinham um objetivo claro: fazer filmes africanos, mas, sobretudo, insistir na importância da cultura no combate pela independência. O grupo desempenhou um papel determinante na redação de textos e resoluções para o desenvolvimento da arte na África (TAPSOBA, 2005). Muitas dessas resoluções proclamavam a necessidade dos africanos apropriarem-se do cinema como meio de despertar as consciências e incentivava a criação de um festival sobre a arte africana. Preocupado com a existência de verdadeiras medidas de acompanhamento do jovem cinema africano, o grupo chegou a preconizar, durante o primeiro colóquio sobre a arte negra, a criação de um organismo inter-africano de cinematografia que teria sua sede em Dakar (Senegal). Esse organismo estaria encarregado da organização regular de encontros entre profissionais africanos da área, da formação de cineastas, técnicos e comediantes africanos, e da adoção de medidas que favorecessem o desenvolvimento de todos os setores da indústria cinematográfica. A organização das “Jornadas Cinematográficas de Cartagena” (JCC) em 1966 na Tunísia e da “Semana do Cinema Africano” em 1969, que lançou as bases do FESPACO em 1972, são concretizações de algumas recomendações do Grupo de Vieyra à classe cinematográfica africana. As ações do Groupe Africain de Cinema englobavam reivindicações políticas e ideológicas, como também propostas concretas endereçadas aos governos africanos para o empreendimento de consistentes políticas cinematográficas na África. O grupo de Vieyra não atuou isoladamente. Seus esforços estiveram coordenados e alinhados ao combate político e estético dos poetas e escritores africanos e da diáspora pela emancipação e revalorização da imagem do povo negro.

Os cineastas organizam-se em torno de uma entidade jurídica a partir de 1970 com a criação da Federação Panafricana dos Cineastas (FEPACI), resultante dos ideais políticos e panafricanistas do Grupo de Cinema africano. Essa entidade dá um passo adiante no engajamento coletivo do cinema africano que inclui tanto os cineastas da África negra quanto do Maghreb. O FEPACI retoma o discurso do Grupo de Vieyra pela adoção de políticas cinematográficas na África. Muitas decisões de nacionalização do cinema por alguns governos foram tomadas com o incentivo e o aval ideológico da Federação dos cineastas africanos. A FEPACI não somente preconizava uma maior organização entre os cinemas africanos, bem como recomendava um maior envolvimento dos estados africanos no setor cinematográfico.

Os cinemas africanos e o panafricanismo

FESTIVAL PANAFRICANO DE ARGEL, de William Klein (Argélia 1969) Não somente todas as gerações de cineastas africanos apresentam uma diversidade temática e estética em suas obras, como seus trabalhos são reveladores de uma descontinuidade nas respostas frente aos desafios políticos e sociais ao longo da história da África. Se falamos de « gerações cinematográficas » é mais pelo compromisso com as questões de construção identitária e nacional do que propriamente por questões de divergência de ordem puramente estética. Independentemente da forma ideológica ou pragmática como elas encaram a relação ambígua mantida com a França e a herança colonial e neo-colonialista, todas estas gerações de cineastas africanos têm em comum um compromisso com a questão da construção da identidade nacional. Esta questão é problematizada de forma mais ou menos intensa dependendo da geração e época; mas a questão perpassa todos os filmes produzidos do norte ao sul da África. Às vezes a questão da valorização das culturas locais transborda o âmbito nacional para desaguar na perspectiva da construção do panafricanismo ou no nacionalismo árabe-muçulmano.

Que tipo de esclarecimento e problematização o cinema feito na África traz ao debate sobre as implicações diretas e indiretas no processo de construção da nação? À primeira vista a resposta parece difícil por várias razões. Primeiro, porque a atividade cinematográfica é ainda incipiente e quase inexistente em muitos países africanos. Por outro lado, se a África não é uma nação, os países que a compõem estão longe de se constituírem em entidades nacionais plenas. Conceber os filmes africanos10 em termos de cinematografias nacionais pode parecer algo excessivo na medida em que este conceito pressupõe a existência de um projeto consensual de construção de valores comuns em torno dos quais as comunidades étnicas se reconheçam. Como sabemos, após a descolonização da África, à emergência de novos estados não sucedeu automaticamente uma consciência nacional ou nacionalista a ponto de fragilizar as clivagens étnicas. Ao contrário, a conquista da soberania e do direito à auto-determinação na África deu lugar a movimentos de reivindicações identitárias de cunho étnico-tribal no interior de cada Estado. Entretanto, se partimos da premissa que o cinema, como as outras formas artísticas - independentemente da quantidade de filmes produzidos por ano - tem um compromisso particular com o processo de construção da consciência nacional, há de se procurar nos filmes africanos indícios daquilo que Frodon chama de “projeção nacional” (FRODON, 1998). A apropriação do cinema pelos povos africanos nos faz vislumbrar uma outra forma de problematização da figuração da nação pelo cinema?
O compromisso do cinema africano com a construção de uma identidade cultural deve ser procurado para além dos limites das fronteiras artificiais e fictícias herdadas da colonização e que definem os contornos dos estados modernos africanos. Diante de uma realidade desoladora e desesperadora, a África vive ou sobrevive graças aos seus mitos fundadores. Esse passado mirabolante e glorioso narrado pelos griots11 funciona como uma estratégia de superação e de revanche ao colonialismo. As grandes epopéias transmitidas pela tradição oral e pela literatura servem de refúgio e de matéria-prima para a construção de uma identidade cultural local, mas também continental. As raízes do sonho do panafricanismo (sempre renovado e fracassado) devem ser buscadas neste elan coletivo e quase natural dos artistas de todos os países africanos em se apropriar dos mitos coletivos na sua criação artística. Os grandes impérios e personagens da era pré-colonial não têm mais fronteira. Na sua dimensão cultural, os cineastas realizam, no panafricanismo, aquilo que os governantes não conseguem concretizar politicamente: a integração da África a partir de velhos mitos e novos valores em que se reconhecem todos os africanos, independentemente de sua nacionalidade. O que leva muitos autores a dizer que o lugar da cultura africana, nas suas diferentes manifestações e expressões (música, literatura oral ou escrita, artesanato e artes, estética e obras criativas), foi sempre contribuir aos ideais coletivos, porém sem negar uma função de humor, de jogo e de divertimento.

Enquanto no ocidente e nas sociedades modernas pós-capitalistas as grandes narrativas ficcionais mecânicas continuam relegando as lendas e a própria literatura à segundo plano, nas sociedades tradicionais africanas elas são os substratos da tradição oral que alimentam os imaginários e a narrativa cinematográfica. O engajamento político e panafricanista do cineasta não se traduz apenas por uma volta incessante e esquizofrênica para o passado, mas o situa também no presente. Nos filmes africanos os temas fortes da atualidade são abordados sem complacência. O espaço fílmico funciona de maneira genérica e simbólica. A representação de um fato e de uma realidade sócio-política em um determinado país não vale apenas para este país, ela concerne simbolicamente a todos os países africanos. Os filmes Andanggaman (Roger Gnoan M’Bala, 2000) e Guimba- Um tirano, uma época (Guimba, un tyran une époque) (Cheick Oumar Sissoko, 1995) representam esta situação. GUIMBA, UM TIRANO, UMA ÉPOCA, de Cheick Oumar Sissoko (1995)Em Guimba, Cheick Oumar Sissoko recorre a lenda de um chefe tradicional tirano (Guimba) para problematizar uma das pragas da maioria dos estados africanos: a tirania hereditária instaurada de forma implacável pelos dirigentes africanos depois das independências. A história de dominação cega que Guimba e seu filho impõem aos seus próprios congêneres acontece numa cidade do Sahel, mas poderia ser transposta a qualquer país da África. Em Andanggaman, Roger Gnoan M´Bala vai mais longe. Ao revisitar o tema da escravidão, o cineasta de Costa do Marfim não se contenta com uma representação lamuriante desse momento doloroso da história da África. Ao contrário, ele põe em cena a controvertida participação dos chefes tribais no tráfico negreiro. Esta reconstituição histórica põe em questão, de forma crítica, a responsabilidade dos chefes de Estados africanos.
O engajamento panafricanista dos cineastas (que se afirmou em 1969, de forma programática, através da criação da FEPACI) se reflete, portanto, na diversidade dos temas abordados e dos espaços geográficos que servem de pano de fundo às ações. Esta tendência é mais nítida, inclusive, nos trabalhos da nova geração de cineastas africanos que não hesitam em situar a ação de seus filmes em vários países. Os dois documentários realizados em câmera digital pelo senegalês Moussa Touré se situam neste viés. o sengalês Moussa Touré que dirigiu 5x5 (2005)No filme 5x5 (Moussa Touré, 2005), é a poligamia que é o assunto principal. Toda a intriga ocorre num cortiço modesto onde a câmera explora, sem cair no denuncismo, as facetas desta prática ainda vigente e comum a vários países africanos. No seu primeiro documentário também rodado com câmera digital, Nous sommes nombreux (Somos numerosas, 2003), Moussa Touré aborda a realidade das mulheres congolesas estupradas durante a guerra. Para ele, como para a maioria dos cineastas africanos da jovem geração, a câmera digital proporciona uma maior facilidade para filmar, mas, sobretudo, uma maior facilidade de se deslocar e capturar a realidade africana em todas as suas nuances e nos diversos lugares do continente.

Conclusão

A economia cultural e particularmente a economia política do cinema ainda não fazem parte da realidade dos países africanos. Ora, num mundo globalizado onde há pouco espaço para as culturas e expressões artísticas dos países periféricos, urge para os governos africanos ganhar outra batalha por sua emancipação cultural. Para isso precisam se dotar de verdadeiras políticas culturais e inserir o cinema entre suas prioridades.
Depois da primeira década das independências, o movimento de apoio à emergência de cinematografias definitivamente engajadas na luta pela afirmação de uma identidade própria sofreu uma grande inflexão. As singularidades dos cinemas africanos encontram-se nas contradições que pontuam a própria história das políticas cinematográficas na África. As medidas de acompanhamento da produção e circulação dos filmes na África é uma longa história de sucessivas rupturas no esforço de apoio público às produções locais. Em alguns países, a aventura das televisões públicas africanas fez declinar os esforços governamentais de apoio ao cinema nacional. A partir daquele período, a produção cinematográfica começou a estagnar e vive desde então uma paralisia.
A salvação das cinematografias africanas vem de fora da África. Enquanto as televisões públicas se transformaram num instrumento político de propaganda e desinformação, os cinemas africanos rumam em direção ao cinema de autoria graças a diversas formas de ajuda internacional que sustentam os esforços de produção e de distribuição (OKALA, 1999). Paradoxalmente é o ocidental, através de seu olhar, das suas teorias, de seus festivais e da sua crítica cinéfila, seus mecanismos de apoio aos cineastas africanos e seus festivais, que vai fazendo a promoção das produções cinematográficas provenientes do Continente Negro. Assim, para muitos autores, a aventura cinematográfica na África negra não passa de uma busca de identidade própria e de reapropriação da sua própria realidade. Fazer cinema na África procede, antes de tudo, de uma problemática existencial que envolve o olhar, isto é, uma reconquista do olhar sobre si (BARLET, 1996). Este esforço implica uma reavaliação do papel dos festivais internacionais e panafricanos na promoção dos filmes africanos.

Referência bibliográfica:
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Publicado originalmente em Cinema no Mundo: indústria, política e mercado, de Alessandra Meleiro (Org.)


1. Neste aspecto didático, é bom citar o caso exemplar do Festival des Cinémas d’Afrique du pays d’Apt (Vaucluse-França) que, além de incluir na sua programação alguns filmes selecionado no FESPACO, organiza debates e encontros entre cineastas africanos e o público jovem das escolas.
2. É bom lembrar que foi no Festival de Cannes que foram revelados estes dois grandes cineastas africanos, notadamente graças aos seus respectivos filmes Brightness (Yeelen) em 1987 e The Law (Tilaï, 1989) em 1990
3. Citado por Stuart Hall (2003), a respeito da re-invenção do conceito de nação pela diáspora caribenha na Inglaterra.
4. 4. Os estudos da recepção de viés semio-pragmático têm se esforçado para destacar a importância destas determinações extra-textuais sobre a atividade de leitura fílmica.
5. Este conceito é utilizado por Yuri Tsivian para analisar as particularidades culturais que informam a leitura do fenômeno cinematográfico na Rússia no período do primeiro cinema.
6. Havia 26 filmes inscritos e representando 16 países africanos, num total de 135 filmes provenientes de 29 outros países.
7. Conceito e movimento de reivindicação e de afirmação dos valores culturais negros. O termo negritude foi lançado pelos poetas Leopold Sedar Senghor, Aimé Césaire e Leon Damas.
8. Além, do FESPACO, é bom mencionar o caso do festival do cinema africano de Khouribga, que está na sua décima edição e acontece no Marrocos. É um festival que nasceu da tradição do cineclubismo na África.
9. Em 1984, em reação àquilo que era considerado marca do colonialismo, o nome do país, Alta Volta, muda para Burkina Faso (Terra dos homens íntegros, em língua local).
10. A categoria « cinemas da África » se refere ao conjunto da produção cinematográfica dos 54 países africanos, ao trabalho de mais de 850 diretores (entre os quais mais de 430 realizadores egípcios) e a um total de mais de 8 800 filmes. Este censo é da mediateca de Ciné3Mondes (uma das maiores fontes de documentação sobre o cinema africano online). http://www.cine3mondes.fr/
11. Espécie de trovador e narrador de epopéias: memória viva nas culturas orais da região do Sahel.

por Mahomed BambaAfroscreen | 4 Julho 2010 | cinema, cinema africano, Fespaco, festivais