domingo, 26 de maio de 2024
Brincadeiras de Ana Beatriz. Maio de 2024.
sábado, 4 de maio de 2024
ATOS DE FALA. Livro de Jairo Gerbase. Campo Psicanalítico. MAIO, 2024.
A escolha de interlocução e leitura do livro : Atos de Fala deve-se a minha tentativa de dialogar com um Campo Psicanalítico que tenho admiração, respeito e curiosidade. Recentemente tenho participado na condição de ouvinte on-line de alguns cursos e palestras oferecidos neste âmbito , lançamento de livros e atendi ao convite para a sessão do filme: Capitão Fantástico. Uma preciosidade de debates e perspectivas de olhares.
Nunca li Freud nem Lacan, minha formação acadêmica se faz no âmbito das Ciências Sociais. A escolha de interlocução não se faz na condição de pertencimento mas na de analisanda por períodos distintos, na década de 80 e mais recentemente, pelo enfrentamento da perda da minha mãe, num momento de dor. A escolha da Psicanálise como uma fonte de auto-conhecimento e enfrentamentos trouxe-me possibilidade de compreender melhor as adversidades e seguir a caminhada, sinto-me agradecida.
O livro que escolhi: Atos de Fala/Jairo Gerbase.- Salvador: Associação Científica Campo Psicanalítico, 2015.
Peço licença para trazer fragmentos da leitura e em seguida convidar seu autor para participar do diálogo,enriquecendo a interpretação do texto. Os fragmentos do texto são escolhas pessoais e aleatórias. No momento, ei-las:
" O que se cura quando o analisando fala? O que se cura quando o paciente faz uso de um medicamento?" ( apud 9)
Tecendo uma argumentação em que Freud, Lacan são referências de base o autor nos leva ao encontro de Judith Butler e John Austin.
" Como se fazem e se desfazem sintomas com palavras? O modelo é o chiste. Com um jogo de palavras se realiza o gozo de rir. Da mesma maneira com o sonho, com um jogo de palavras se realizará o gozo de dormir" ( apud 10)
" A psicanálise é um método que consiste em desfazer um sintoma pela fala. Isso só é possível se o sintoma foi feito pela fala. O modelo para esse tipo de sintoma, que denominamos formação do significante, é o chiste" ( apud 18)
" O chiste, a piada, é uma forma de tornar evidente que a fala tem efeitos, no caso, o efeito do riso, que é um efeito de prazer ou de gozo. No diálogo entre judeus, o cego pergunta : como você vê ?" O efeito do riso é obtido exclusivamente através de um jogo com o duplo sentido das palavras "anda" e "vê" ( apud 18)
" A psiquiatria sabe dizer como a fluoxetina opera. A infectologia sabe dizer como a penicilina age, qual o seu mecanismo de ação. E a psicanálise, saberia dizer como a palavra opera?" ( apud 20)
" Ha indicadores neste sentido. O primeiro deles é o desejo do analista. O segundo é que o analista se dê conta das palavras para o analisando. O terceiro é que aprende a manejar a topologia da fala, que saiba que o significante é estruturado em termos topológicos, e o que o sintoma é um enodamento do real, do simbólico e do imaginário. O quarto é que saiba que o sintoma não é um feito do conflito entre gerações vizinhas, entre pais e filhos, ou do complexo de Édipo, mas um conflito em uma mesma geração, entre os significantes homem e mulher, determinado pelo fato de que a relação é impossível ( apud 21)
" A piada é essa coisa que o espírito humano sabe fazer com muita graça e que Lacan denominou de formação do inconsciente, e que quer dizer que o sujeito do inconsciente se apresenta também por intermédio da piada" (apud 23)
" A piada, segundo Lacan, revela-se como a melhor entrada para compreender o que é uma formação do inconsciente, a melhor maneira de se compreender as relações do inconsciente com o significante e sua técnica" (apud 24)
Pretendo parar por aqui nas citações.
O ensaio deste livro contém um sumário extenso nos quais não me proponho a busca de síntese, mesmo porque a teoria que embasa a proposta requer aprofundamento. A seguir: Topologia da fala, Como se fazem e se desfazem sintomas com palavras, Familionário, Alegria, alergia, A palavra faz a coisa, O mesmo e o outro, Uma prática que recusa categorizações, Pais e filhos, Apego, A pulsão, Amuro e asexo, Falalogia, A fala é uma droga, Ou não há contradição ou não há relação, Ha performativo em psicanálise?, O ato psicanalítico é um performativo?, Ato de fala e ato analítico, Metapragmática, Falalogia e falsear.
No entanto, convido para dialogar sobre o tema e encaminho as minhas questões:
1. O que acontece quando o analisando fala?
2. Como demonstrar a evidência de que falar cura?
3. Como se fazem e se desfazem sintomas com palavras?
4. É possivel ao leitor que não domina a teoria freudiana e lacaniana entender o ensaio de Atos de fala?
5. Analisanda desde os anos 80 e reaproximando- me mais recentemente, quando da perda de minha mãe, aprendi a confiar no trabalho Psicanalítico e a desenvolver estima e admiração por quem desenvolve o trabalho analítico com competência e sabedoria.
No momento reativando um espaço que construí em 2007, na mídia eletrônica, o Blog: Cultura, Política e Cinema, postei inúmeros comentários e relatos sobre atividades que participei na condição de estudiosa e pesquisadora de temas que escolhi para dialogar. A leitura do livro Atos de Fala para mim é um desafio pois a área do Campo Psicanalítico é densa, muitos conceitos que requerem maior intensidade de pesquisa, porém por experiência e vivência, sou resultante de um trabalho psicanalítico que muito me ajudou na caminhada, diria até curada ( se não me engano) . É possível a cura?
"Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil...Parafraseio o Alberto Caeiro: " Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma". Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer...Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos estimulado pela revolução de 64. Contou-me de sua experiência com os índios. Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. ( Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio, abrindo vazios de silêncio, expulsando todas as ideias estranhas). Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouviremos a melodia que não havia, de tão linda que nos faz chorar." Texto de Rubem Alves.