quarta-feira, 26 de março de 2008

Conversa sobre Cinema










Em outubro de 2007 iniciamos a postagem Conversa Sobre Cinema.
A idéia era manter diálogos com estudiosas(os), cinéfilos(as), críticos(as) da sétima arte, registrando anotações que do nosso ponto de vista poderiam ampliar concepções, retomar dúvidas, provocar questionamentos.
Pensando em anotações sobre a temática, contamos desta vez com a colaboração de Adolfo Gomes _ http://bressonianas.zip.net/_ que aceitou e foi receptivo ao nosso convite. Apresentamos um roteiro de perguntas que foram abordadas do jeito peculiar e distinto do responsável pela divulgação dos filmes exibidos na Sala Walter da Silveira e que a considera um templo sagrado (1).

Blog: O que significa cinema para você? Qual a sua experiência com o cinema?

Bressonianas: Minha experiência com o cinema é de espectador. Nunca tive vontade de filmar, de me tornar um realizador. Mas nem por isso me considero um admirador passivo. Sempre quis descobrir, ver coisas novas, que podem estar esquecidas num filme de 1920, por exemplo. Então é natural que de espectador logo tenha me transformado em cineclubista. Mais do que a minha formação em jornalismo, minhas passagens como crítico de cinema ou qualquer outra atividade, ser cineclubista é minha universidade, o que me faz melhor como pessoa, intelectual.É o que me honra. Acho que isso explica a minha relação com o cinema. É, para mim, um religar-se com a dimensão sagrada das coisas.

Blog: Quais os seus melhores filmes? Eles influenciaram suas idéias?

Bressonianas: Como diz o Godard, “o que é o estilo, senão o homem”. Minha formação é perpassada pela política do autor. Portanto, vejo o cineasta, sobretudo. Assim, para mim, é mais fácil falar dos cineastas que amo: Godard, Straub/Huillet, Glauber Rocha, Humberto Mauro, Renoir, Pedro Costa, John Ford, Sokurov, entre outros. E os filmes deles me fizeram o que eu sou hoje, minha concepção de cinema. Ainda tenho um longo caminho ao lado desses filmes. Em certo sentido, quero dizer com isso, a mesma coisa que costumo dizer a alguém que não gostou de um filme do Godard, por exemplo: “Então veja de novo, de novo, até gostar. Até você alcançá-lo”. O grande cinema tem que ser exigente. Não podemos esperar apenas um espetáculo de mão beijada.


Blog: E as Bressonianas?

Bressonianas: O blog é parte do que eu sou, de como vejo cinema. Escrevo para continuar o prazer proporcionado pelos filmes, por isso só escrevo por prazer, sem pressões, cobranças ou temporalidades.Todos os críticos deveriam ter essa liberdade.


Blog: E a Sala Walter da Silveira ?

Bressonianas: É, para mim, um espaço de exibição. Portanto algo sagrado, mas não a vejo somente fisicamente, de modo que meu afeto por ela não é abalado por suas limitações atuais, sejam técnicas, sejam de programação. Vejo-a como um instrumento em favor do cinema, de manutenção da memória, de preservação da arte.E de resistência. Por isso a minha relação com ela é religiosa. Vou passar por ela e tenho o prazer - e não apenas a responsabilidade - de honrá-la a cada dia, de honrar a memória do doutor Walter da Silveira que, para além das homenagens oficiais, ritos e cerimônias, mantém-se viva nos filmes que ele amava e que escrevia a respeito. Colocar esses filmes e outros, ao alcance das pessoas, é o melhor que podemos fazer pela sua memória – pelo menos para um cinéfilo como eu (2).


Notas:

(1) Walter da Silveira (1915-1970).
Obras publicadas sobre cinema: O Cine-Teatro Guarani: sua origem, evolução e atualidade. 1919/1995. Salvador: Imprensa Oficial da Bahia, 1955; A grande feira: origem e significado: Imprensa Oficial da Bahia, 1960; Um filme de transição. In: Deus e o Diabo na Terra do Sol de Glauber Rocha. Biblioteca Básica de Cinema. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965; Fronteiras do Cinema. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1966. Coleção Tempo Novo; Imagem e roteiro de Charles Chaplin. Salvador: Mensageiro da Fé, 1970; A história do cinema vista da província. Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1978; O eterno e o efêmero/Walter da Silveira. Organização e notas por José Umberto Dias. Salvador: Oiti Editora e Produções Culturais Ltda., 2006.

(2) Bem, essa conversa de cinema que pretendia ser mais uma aproximação com Adolfo Gomes e suas idéias, ocasionou também outro convite, o de aproximar-me, mais ainda, da obra de Walter da Silveira. E nesta prospecção, descobri que o Clube de Cinema da Bahia foi fundado em 1950, ano em que nasci, com a sorte de encontrar uma memória cinematográfica que se mantém e resiste. Nos anos 70/80 asisitimos e convivemos com esta filmografia que tem raízes subsumidas nesta memória.